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Escrito por Magno de Aguiar Maranhao   
Qua, 07 de Julho de 2004 21:00

No Brasil, insistimos, equivocadamente, em misturar três problemas distintos da área da cultura e educação (arriscando-nos a não resolver nenhum). O primeiro é o fato da população não ter o hábito da leitura, o que colabora para que permaneça inculta e desinformada. O segundo está no preço exorbitante de livros e revistas, em contraponto com o baixo poder aquisitivo dessa população, o que não propicia mudanças de hábito. O terceiro reside nas escolas, que não cumprem sua tarefa maior (base para o sucesso de todas as outras): ensinar a ler. Não as critico por não transformarem alunos em freqüentadores de livrarias, mas por alfabetizarem mal. Não ter o costume de fazer algo não significa que não saibamos fazer; da mesma forma, nossos alunos podem não se interessar por livros, mas não podemos usar isso como justificativa sempre que uma pesquisa constata que eles atravessam a educação básica incapazes de entender sequer uma notícia mais elaborada de jornal. Os três problemas estão relacionados, mas as soluções para cada um são diferentes.

O mais grave não está em não ler, mas em não conseguir ler. Sabemos que o esforço para localizar informações e estabelecer conexões em um texto é um exercício mental que nos capacita a agir com eficácia em qualquer situação que nos exija raciocínio e interpretação dos fatos. Logo, a educação só pode ter início com o desenvolvimento das habilidades da leitura e escrita; sem elas, até o entendimento de outras disciplinas é prejudicado. No entanto, apenas 25 por cento da população as dominam plenamente, e isto é curioso, porque (à exceção dos 13 por cento de analfabetos absolutos) a maioria passou pelas primeiras séries do ensino fundamental e, portanto, deveriam ter desenvolvido tais habilidades, o que não ocorreu. Assim, 67 por cento dos brasileiros são analfabetos funcionais (30 por cento só são capazes de achar informações simples dentro de frases, e 37 por cento dentro de textos curtos). Entre universitários, 35 por cento não atingem o nível pleno de alfabetismo, isto é, alcançaram o topo da pirâmide educacional, sabe-se lá como, sem a condição sine qua non para o início do percurso escolar: a competência para entender o que se lê e expressar-se com coerência ao escrever.

Os dados acima são do INAF (índice nacional de analfabetismo funcional, medido por um estudo do Instituto Paulo Montenegro e ONG Ação Educativa) e nos remetem a absurdos que, de tanto ouvirmos falar, parecem normais. Um deles reza que a causa dos brasileiros lerem pouco está na baixa escolaridade. Concordo que seja uma das causas, não a única. Contudo, ler pouco é uma coisa; ler mal, outra bem diferente. A primeira obrigação da escola é tornar os alunos aptos a interpretar um texto, e é inadmissível que tantos concluam a educação básica sem compreender textos mais complexos que receitas de bolo. Aliás, a julgar pelo grau de dificuldade dos jovens em lidar com letras impressas, algumas receitas de bolo podem ser indecifráveis para eles (recordando: fomos os últimos colocados no Programa Internacional de Avaliação de Estudantes, que aferiu a capacidade de leitura de jovens de 15 anos de 32 países).

Pedagogos e professores devem rever suas prioridades e métodos se querem enfrentar o desafio da alfabetização de fato. Chamo atenção, ainda, para os livros didáticos que, independente da disciplina a que se destinam, podem ajudar os educadores nessa batalha. O MEC, este ano, gastou R$ 220 milhões dos R$ 620 milhões destinados ao Programa Nacional do Livro Didático com a distribuição e avaliação de 124 milhões de exemplares. O objetivo é barrar os que contêm erros conceituais, alimentem preconceitos e se apóiem em metodologias que privilegiem a memorização em detrimento do raciocínio. O MEC deveria determinar, ainda, que até livros de Matemática fossem permeados por textos agradáveis, talvez com curiosidades e dados históricos, que tornassem sua leitura menos árida e mais instigante. Estamos falando em interdisciplinaridade, em tornar o ensino menos fragmentado e mais coeso, para que faça sentido. Não podemos admitir um sistema em que, ao fim da aula de Português, as crianças devam armazenar o que aprenderam em um canto no cérebro e achar um espaço vazio para, então, aprender a fazer contas. Este é um problema.

Outro está no fato de nossa população ter se acomodado a suas deficiências. Entre brasileiros ditos instruídos, 38 por cento lêem jornais apenas uma vez por semana, 41 por cento não escrevem e 37 por cento não lêem no trabalho. Quanto aos jovens, estudo da Unesco (2000) constatou que 80 por cento não lêem jornais, 62 por cento não lêem livros e 57 não lêem revistas. O Brasil parou diante da TV: há 40 milhões de lares com televisores e, se o aparelho enguiçar, a família faz das tripas coração para comprar outro. No entanto, somente dois exemplares de revistas são vendidos ao ano por habitante (nos Estados Unidos e França esse número pula para 30 e 47, respectivamente). Portanto, é imprescindível que o MEC se empenhe nos programas de fomento à leitura, como Biblioteca Escolar, Biblioteca do Professor e Casa da Leitura, lançados em 2003, e desencalhe 11 milhões de livros paradidáticos comprados e não distribuídos. Afinal, para fazer da leitura um hábito, é preciso disponibilizar a ferramenta principal: o livro.

É aí que o problema complica. No Brasil, há poucas bibliotecas e, em 957 de nossos 5.500 municípios, não há nenhuma. Em 89 por cento, não há livrarias. Além disso, o produto é caro: segundo a Câmara Brasileira do Livro, 73 por cento dos livros estão nas mãos de 16 por cento dos brasileiros e sete entre dez não-leitores têm baixo poder aquisitivo. Para piorar, o governo federal acaba de fazer gol contra: livros, revistas e jornais importados deverão pagar 9,25 por cento referentes ao PIS e Cofins (Lei 10.865; votação recente), o que revoltou intelectuais e editores. Eles argumentam, com razão, que devemos nos manter atualizados com a produção de conhecimento no resto do mundo, e o impacto negativo sobre a cultura, ciência e pesquisa, com a nova lei, será maior que o prejuízo das livrarias. Será que o programa Fome do Livro, a cargo do Ministério da Cultura e Biblioteca Nacional, pretende aumentar a fome ou saciá-la?

Neste contexto, como fazer eco à queixa de editores relativa à "indústria da xerox" nas instituições de ensino superior? Pesquisa da Associação Brasileira de Direitos Reprográficos em 13 IES de São Paulo revelou que 99 por cento dos estudantes usam cópias de livros, ao invés de comprá-los. São 226 milhões de páginas copiadas/ano (no país, a estimativa é 1,935 bilhão). A cópia prejudica autores e editores, mas salva os alunos. Quantos, afinal, têm renda para adquirir todos os livros cuja leitura é exigida durante o curso? Seguramente, número tão reduzido quanto o de brasileiros com dinheiro no bolso para entrar em uma livraria, ser atraído por um exemplar e sair de lá com ele.

 
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