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Teses / Dissertações ESTRUTURAS AUTOTENSIONADAS COM BAMBUS E CABOS
ESTRUTURAS AUTOTENSIONADAS COM BAMBUS E CABOS PDF Imprimir E-mail
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Escrito por Luís Eustáquio Moreira , Dr.; José Luís Mendes Ripper , Livre Docente; Flávio Caliman   
Qui, 18 de Março de 2010 09:25

 

ESTRUTURAS  AUTOTENSIONADAS COM BAMBUS E CABOS APLICADAS A COBERTURAS AÉREAS


Luís Eustáquio Moreira , Dr.; José Luís Mendes Ripper , Livre Docente; Flávio Caliman

 

Prof. Adjunto III; Universidade Federal de Minas Gerais, Este endereço de e-mail está protegido contra SpamBots. Você precisa ter o JavaScript habilitado para vê-lo.

Prof. Emérito; Pontifícia Univ. Católica do Rio de Janeiro

Estudante de Graduação;  Universidade Federal de Minas Gerais


RESUMO

 

Uma das características dos objetos pós-modernos, segundo Beukers & Hinte [1999], que os diferenciam completamente dos objetos tradicionais é a leveza, possível graças ao surgimento de novos e resistentes materiais, à análise estrutural 3D computadorizada, que aproxima com maior fidelidade o comportamento real do sistema.  Neste contexto, a colaboração entre Engenheiros de Estruturas e Designers de Produtos é extremamente útil se o objetivo é um objeto bem ajustado a parâmetros como equilíbrio de formas e detalhamentos construtivos, conforme citado em Moreira [2008].

Como dizia o arquiteto Le Corbusier, “a arquitetura começa com uma cobertura”, e é  exatamente na cobertura que se evidencia a leveza das construções contemporâneas. Estas, conhecidas como tensoestruturas, utilizam normalmente mastros e cabos de aço para tracionamento de membranas sintéticas de alta resistência. Estas novas soluções são  pertencentes à família das antigas  tendas. Vestígios arqueológicos de 40 mil anos, encontrados na Ucrânia, mostram que as primeiras tendas foram construídas com  ossos de mamute e peles de animais. De fácil montagem e transporte, foram também desenvolvidas com técnica mais apurada pelos povos nômades do deserto – Arábia, Quênia, Etiópia e Cazaquistão, dentre outros. 


Neste artigo é proposto e investigado um sistema estrutural auto-tensionado de barras de bambu, cabos sintéticos e membrana, para a geração de superfícies e volumes que podem ser aplicados em diferentes objetos utilitários. No caso específico, destina-se à cobertura de um abrigo para veículos, para proteção de  chuvas e incidência solar. Trata-se   de um trabalho multidisciplinar que envolve simultaneamente investigações de design, viabilidade estrutural  através de análise pelo MEF SAP 2000 e aspectos construtivos. É dada ênfase às ligações amarradas entre os elementos rígidos e flexíveis da estrutura, bem mais adequada que ligações parafusadas. Evidencia-se, do mesmo modo, a atualidade do bambu como elemento estrutural, contendo todos os requisitos exigidos para um bom funcionamento mecânico: - leveza, resistência, geometria tubular; bem como os requisitos para um sistema produtivo sustentável: - fácil produção, transporte, trabalhabilidade, reposição/manutenção e descarte limpo. Diferentemente das tendas, as estruturas auto-tensionadas diminuem o vão livre das membranas, permitido o uso de tecidos mais baratos e aliviando os sistemas de tracionamento, sem perda da leveza estrutural e arquitetônica.

 

PALAVRAS CHAVE: Estruturas auto-tensionadas, bambus, cabos, design construtivo, acessibilidade

INTRODUÇÃO

 

Há cerca de vinte anos viemos investigando estruturas de bambu, aliando os conceitos e métodos da Engenharia de Estruturas com os procedimentos do Design Estrutural. Trata-se de uma frutífera colaboração entre o LASE – Laboratório de Sistemas Estruturais – do Departamento de Engenharia de Estruturas da EEUFMG com o LILD – Laboratório de Investigação em Living Design – do Departamento de Artes e Design da PUC-Rio.

 

O objetivo da constituição do LASE, em 2004, foi exatamente desenvolver no engenheiro de estruturas a percepção do Design Estrutural e o entendimento da técnica construtiva como parâmetros relevantes de projeto. Eles aliam-se aos métodos matemáticos de análise e dimensionamento, sendo fundamentais para o desenvolvimento da imaginação e intuição, das quais nenhum pesquisador pode se furtar para constituir modelagens realísticas e viáveis.

 

Data de 1980, o primeiro Workshop Internacional do Bambu, realizado em Singapura, tido como um marco do aumento das atividades dessas pesquisas, uma iniciativa do International Development Research Centre (IDRC), do Canadá. Em 1979, após atividades de pesquisas no Canadá, o Prof. Iraniano Khosrow Ghavami traria para o Brasil essas idéias incipientes, que poderíamos denominar genericamente “um olhar para o oriente”. Para os países orientais como Índia, China, Indonésia, Malásia, etc., o bambu é suporte de existência das populações, contando com centenas de aplicações, desde a produção de alimento – broto de bambu – passando a objetos utilitários, em mobiliários, construção civil, artefatos domésticos, etc; até beneficiamentos mais sofisticados como produção de papel e tecidos de alta qualidade, dentre outros. Parte essencial da vida dos orientais, o bambu, com cerca de 1250 espécies e 75 gêneros, é também fonte de inspiração e proteção espiritual para esses povos.

 

No Brasil,  as atividades de pesquisa científicas e tecnológicas do bambu  têm sido divulgadas  principalmente pela ABMTENC (Associação Brasileira de Materiais e Tecnologias não Convencionais) com sede na PUC-Rio, contando hoje com 12 anos de atuação, realizando Congressos Internacionais no Brasil e  no Exterior.

 

As técnicas e materiais que temos utilizado em nossas pesquisas estão amplamente descritas no relatório JOGO das FORMAS – Ontogênese e Design do Objeto, Moreira [2008]. Deste relatório resultou o projeto Estruturas Acessíveis de Bambu - Concepção, Análise e Implementação, financiado pelo CNPq ao final de 2008, com duração de 3 anos, tendo a UFMG como instituição executora e CEFET – MG e PUC – Rio  como instituições colaboradoras.

 

A análise estrutural é realizada sobre  modelos abstratos, denominados sistemas estruturais, que se ajustam a teorias físico-matemáticas de estruturas, cujas equações diferenciais são resolvidas numericamente através de programas computacionais. Alguns sistemas tipo podem ser combinados de forma a resolver uma edificação determinada, visto importar nestas análises teóricas os parâmetros mecânicos dos materiais, parâmetros geométricos e o principio de funcionamento dos sistemas, relativamente independente da edificação particular, a não ser pelas cargas que solicitarão a estrutura em determinado contexto sócio-geográfico. Os parâmetros mecânicos dessas análises advêm de experimentos mecânicos controlados e quantificados por instrumentos de medição.

 

Contudo, a visão específica de análise pouco contempla aspectos de concepção e aspectos concretos de realização das estruturas, dificultando a evolução do objeto visado, que fica deste modo, sujeito a dois destinos: - ou fica  subordinado aos sistemas e materiais convencionais consagrados pelo uso ou apresenta uma série de problemas construtivos que contribuem para que as novas propostas sejam automaticamente rejeitadas.

 

Os diversos componentes de um objeto devem ajustar-se coerentemente, produzindo o que  denominamos uma sintaxe correta, sob pena de surgirem defeitos reais de função e funcionamento, ainda que a estrutura atenda, em teoria, aos aspectos de segurança e utilização  adequados. Deste modo, o engenheiro de estruturas não pode ficar alienado do objeto final visado, se o objetivo é um produto final de qualidade. Portanto, neste artigo, de caráter interdisciplinar, será enfocada a concepção, funcionamento e design  construtivo de um sistema estrutural de bambus e cabos, que será, a título de aplicação, adotado para a cobertura de estacionamento de automóveis. Trata-se de um sistema monobloco autônomo, por isso aqui denominado auto-tensionado.

 

MATERIAIS E MÉTODOS

 

As primeiras idéias relativas a algum objeto,  normalmente não muito claras, levantadas pela intenção e estimuladas pela intuição devem ser assessoradas por outros recursos, como esquemas, conjunto de enunciados, fluxogramas, etc. e começam deste modo a adquirirem seus primeiros esboços concretos, tornando-se menos opacas.

 

Em ciência utilizam-se basicamente duas distinções entre os recursos que se tem para alcançar a explicação de um recorte da realidade, de forma que esta realidade possa tornar-se previsível. As explicações de caixa preta, também conhecidas como abordagens fenomenológicas, pois trabalham sobre variáveis observáveis, portanto aparentes, deixam ocultos os mecanismos internos dos fenômenos observados. Neste caso, perturba-se o sistema, observa-se sua resposta e cria-se uma relação estímulo-resposta, ou seja, com dados de entrada e saída e com variáveis intervenientes. Seria este um primeiro momento da investigação, de amplo uso. 

 

Os experimentos denominados de caixa translúcida, diferentemente, procuram entre os estímulos e respostas, entre a entrada e saída de dados, explicações dos mecanismos internos dos sistemas, que possam, preferencialmente, ser expressos em linguagem matemática. Neste caso, são idealizados modelos, como mecanismos que possam explicar o funcionamento das variáveis internas, de observação muitas vezes indireta e mesmo inobserváveis. A partir destes modelos e das teorias que possam emoldurá-los, lançam-se luzes dentro da caixa preta, continuando o aprofundamento da segmentação e mapeamento da realidade, que consiste verdadeiramente, numa constituição dessa realidade invisível, através de  redes coerentemente explicativas – as teorias, Bunge [2008].

 

À investigação em modelos físicos reduzidos – Experimentos de Design Estrutural –, que caracteriza a  metodologia de Design Estrutural do LILD e adotada pelo LASE, caberia perguntar: - em que sentido contribuiria para o desenvolvimento da pesquisa estrutural e em qual destes procedimentos científicos se ajustaria?

 

Respondendo à segunda parte da pergunta pode-se inferir da contribuição esperada. Experimentos de Design em escala humana, sem instrumentos de medição, são realizados sobre as particularidades do mundo, observáveis a olho nu, numa interação direta com quem manipula a materialidade. Eles são normalmente realizados em laboratório, num espaço à parte, com todas as características de um jogo, um jogo de formas e materiais. O objetivo é a conquista de um objeto bem ajustado, com uma sintaxe coerente, onde se ajustam esquemas e teorias – conteúdos semânticos – à materialidade do mundo, sob os sensores naturais humanos. Trabalhando diretamente sobre o observado, poderia, pelas definições  expostas,  classificar-se como uma atividade de caixa preta. Contudo, observar um experimento não é algo trivial, exige um tempo diferente, que o modelo físico exercita. Exige, por um lado, um olhar armado por teorias e expectativas, e alternadamente, outro totalmente desarmado, apto a capturar o fenômeno nu que se manifesta, sem pré-conceitos e sem expectativas. Neste caso, o modelo físico exercita a transparência do mundo, as condições impostas pelas singelas e autoritárias unidades que compõem os seres. O que se faz, nestes momentos,  é realizar o caminho inverso da abstração que permitiu  controles diversos. A mesma abstração que tornou translúcidos os fenômenos envolvidos no entendimento do funcionamento do objeto poderia obscurecer a concepção e concretização,  se não se apaziguasse  com as variantes  abstraídas, consideradas irrelevantes para a análise. É preciso retornar ao mundo da vida Pizzi [2006], de onde se retirou quando foi  buscar no virtual o  entendimento e formulação do  comportamento mecânico do mundo.  

 

Estes experimentos permitem,  por outro lado, soluções úteis inusitadas, alterando deste modo a própria evolução do projeto estrutural, participando, portanto, da concepção e composição da estrutura, bem como do objeto a que se destina. Logo, não é uma atividade que vem seqüencialmente a um longo trabalho de abstração, como a construção de uma maquete. Ao contrário, ocorre alternadamente e mesmo simultaneamente à  análise estrutural, auxiliando a concepção, o design, a montagem e viabilidade construtiva do objeto.

 

Antecedentes

 

O primeiro passo, para se conceber e projetar um  objeto para determinada função,   é buscar no mundo – literatura, mídia, espaço físico –, possíveis antecedentes, informações que possam contribuir para o objetivo que se propõe: - princípios estruturais; técnicas construtivas, materiais, etc.  Os objetos se dispõem em sistemas, como salienta Baudrillard [1973] e procura-se deste modo, encontrar uma genética para o objeto alvo.

 

Como já dito, as estruturas leves em tenda, têm os primeiros antecedentes há 40 mil anos. Posteriormente, os povos nômades do deserto desenvolveram tendas de grande valor estético e funcional.  Já os auto-tensionados  podem ser encontrados nos balões dirigíveis de Santos Dumont, também no Demoiselle e nas primeiras pipas meteorológicas. Baseado nestes, o LILD iniciou os primeiros Experimentos de Design destas estruturas, Figuras 1 e 2, de onde surgiu a idéia de se moldarem coberturas para a construção civil, Figuras 3 e 4, onde o bambu é o elemento rígido. Estas figuras caracterizam perfeitamente a evolução do Design Estrutural e das idéias que os modelos fomentam.  Desenvolver as conexões dos cabos ao bambu é uma inovação introduzida, assim como esta captura do princípio estrutural das pipas meteorológicas para a realização de coberturas. Vários alunos  contribuíram para este desenvolvimento, todos levando consigo a experiência de ter trabalhado na concepção e concretização do objeto e o exercício de transplantar sistemas e técnicas de um objeto a outro, Ripper et al. [1999].




Figura 1: Octaedro auto-tensionado

Fonte:LILD/ PUC-Rio


Figura 2: Conexão dos cabos

Fonte: LILD PUC-Rio


Figura 3: Suporte auto-tensionado
Fonte: LILD PUC-Rio


Figura 4: Superfície auto-tensionada

Fonte: BAMBUTEC - Rio

 

Teorias e Conceitos da  Engenharia de Estruturas

 

A Engenharia de Estruturas vem contribuir para este desenvolvimento através de seus métodos matemáticos e experimentais de análise, que por sua vez enriquecem o sistema estrutural e possibilitam formas mais arrojadas. Portanto, ela interfere diretamente no projeto, tornando-o sintaticamente mais coerente, uma expressão e configuração condizentes com o seu domínio semântico e pragmático, alcançando deste modo maior segurança, durabilidade e economia para o empreendimento. 

 

Teorias aerodinâmicas, teorias de mecânica dos sólidos e resistência dos materiais, dentre outras teorias físico-matemáticas, aliadas a métodos numéricos de análise computacional e resultados de experimentos mecânicos, permitem que o engenheiro consiga uma forma mais adequada; que distribua os  elementos estruturais de maneira mais conveniente para se conseguir resistência e estabilidade para o objeto almejado. Através do controle de tensões, deformações e deslocamentos, as estruturas tornam-se mais seguras para trabalharem sobre as ações solicitantes da vizinhança circundante, adquirindo por outro lado, maior durabilidade. 

 

EXPERIMENTOS DE DESIGN ESTRUTURAL

 

Estes experimentos são realizados em modelos físicos que evoluem  juntamente com os desenhos e modelos matemáticos. Deste modo, conquista-se passo a passo um estágio satisfatório de aprofundamento na complexidade da realidade física de forma que se  possa  avançar para o protótipo em escala real, eliminando surpresas indesejáveis, que resultam  normalmente em prejuízos econômicos.

 

Neste caso, modelos físicos globais e locais vão sendo elaborados, os quais podem ser de dois tipos, embora seus contornos se interpenetrem: - modelos com características conceptivas, que participam da criação do objeto, que denominamos Modelos Conceptivos e em segundo estágio, modelos mais aprofundados, mais detalhados, que denominamos Modelos Construtivo-Processuais.

 

O Modelo Global Conceptivo abaixo, em escala 1:30, correspondente a uma concha com 6 metros de comprimento e 4 metros de envergadura máxima, Figuras 5 e 6. Desenvolvido no LASE – EEUFMG, o modelo é um jogo com todas as variáveis plásticas, geométricas e mecânicas. A título de levantamento de cargas e escala do objeto, a análise estrutural convergiu para um objeto destinado à cobertura de um estacionamento. Os resultados de funcionamento mecânico do sistema, obtidos com esta particularização, podem ser generalizados para  aplicações diversas. A forma escolhida, de uma concha, teve também o objetivo de mostrar a potencialidade do sistema estrutural para moldar superfícies de membrana com diferentes curvaturas no espaço.    



 
Figura 5: Modelo  Conceptivo Global da Concha. Fonte: LASE EEUFMG



Figura 6: Modelo Conceptivo Global da Concha. Fonte: LASE EEUFMG

Segue o Modelo Construtivo-Processual Global, Figura 7, onde por aprofundamento, surge o design dos pontos de amarração dos cabos e o sistema de tensionamento. Embora os cabos possam ser de aço e as extremidades dos bambus possam ter diferentes tipos de acabamento para receber a fixação,  procurou-se, nessa investigação específica, visando acessibilidade e facilidade construtivas, utilizar cabos sintéticos que serão amarrados às extremidades dos bambus. Pintar os bambus com tintas acrílicas ou outro material que possa selar o bambu, é um recurso para aumento de durabilidade, Figura 8. A forma do bambu continua abaixo da cor, cuja expressão estética é bem mais rica que um regular tubo metálico. Normalmente o bambu costuma perder o viço da cor natural com o decorrer do tempo.

Figura 7: Modelo Construtivo-Processual global.  Fonte: LASE EEUFMG



Figura 8
: Pintura impermeabilizante – fungicida – UV. Fonte: LASE EEUFMG


No Modelo Conceptivo, as barras de fibra de vidro foram coladas, embora já sejam em número, iguais ao que será utilizado no protótipo em escala real e os cabos utilizados foram linhas de algodão, tracionadas sem uma preocupação com a viabilidade construtiva.

 

Já no Modelo  Global Construtivo-Processual, em escala 1:6,  as barras são bambus de 10 a 15 mm de diâmetro, as extremidades e pontos de cruzamento dos bambus foram trabalhadas já representando o design construtivo, os elementos rígidos foram amarrados entre si e os cabos foram tracionados por trecho, já apontando a solução final. Neste modelo, tanto o processo como os detalhes construtivos vão clareando a  futura atividade de fabricação e montagem.   

 

Finalmente os modelos Construtivo-Processuais Locais permitem a investigação final dos pontos críticos – conexões entre bambus e bambus e cabos –. Um longo período de pesquisas conduziu também aos elementos de fixação dos cabos aos bambus, conforme os modelos locais, Figuras  9 e 10. Tratam-se de bandagens de tecido coladas à superfície do bambu. Os sulcos entre bandagens e o afastamento das bandagens da extremidade dos bambus, visam evitar o escorregamento da corda. O polvilhamento de areia sobre a bandagem, com o adesivo ainda úmido, aumenta por outro lado, o atrito das cordas, melhorando a fixação.

Figura 9: Modelo Construtivo Local para  extremidades. Fonte: LASE EEUFMG




Figura 10: Modelo Construtivo Local para  cruzamentos. Fonte: LASE EEUFMG


Os modelos conceptivos são quase um desenho tri-dimensional, ou seja, trazem a leveza da abstração, da organização espacial pretendida. Já  os modelos construtivo-processuais, ganham riqueza estrutural, concreta, através das particularidades do material, geometrias  e componentes.

 

ANÁLISE ESTRUTURAL


Atualmente,  com o desenvolvimento da tecnologia, os métodos para análise estrutural associados aos pré e pós-processadores gráficos vêm se tornando cada vez mais realistas e eficientes. A utilização destas ferramentas possibilita o desenvolvimento das estruturas, através do entendimento do funcionamento integrado que elas proporcionam, e da introdução de modelos mais complexos,   o que não era possível nos anos passados. O objetivo desta análise é determinar a intensidade das tensões e deslocamentos resultantes  no sistema proposto, através do programa MEF SAP2000.

Condições de carregamento

Foram consideradas  as ações de peso permanente da estrutura, a ação variável  do vento e uma lâmina d´água de 1 cm de espessura  como sobrecarga, por ocasião de chuvas fortes.

 

Os coeficientes aerodinâmicos e pressão dinâmica do vento foram tomados segundo recomendações ABNT [1988], cuja contextualização conduziu a uma pressão dinâmica de valor característico . Por analogia com geometrias já estudadas em túneis de vento,       Anderson [1991], sabendo-se por outro lado que o comportamento aerodinâmico de objetos de geometria complexa e leves somente pode ser conhecido através de experimentos em túneis de vento, foram tomados dois coeficientes aerodinâmicos para toda a superfície da membrana. O coeficiente = -1,0 vertical para cima, que será multiplicado pela área de influência projetada no plano,  correspondente à sustentação ou alívio da superfície ou o coeficiente c = 0,5 no sentido da gravidade,   carregando a   estrutura. Vento e sobrecarga foram distribuídos para os nós por áreas de influência, conforme a Figura 11, em que cada hachura  representa a área de influência  projetada no plano, para o nó numerado.




Figura 11: Área de Influência das Ações na Membrana

As ações foram combinadas conforme ABNT [2003], com os seguintes coeficientes de ponderação e combinação:

Carregamento 1: 1,4  X (Ações permanentes)   + 1,4 X ( Vento que carrega) + 1,4 X (Sobrecarga) X 0,6


Carregamento 2:  0,9 X (Ações permanentes) – 1,4 X (Vento de alívio)

Para os bambus e cabos considerou-se uma densidade aparente de    e bitolas com diâmetro externo médio de 10 cm e espessura média de parede de 0,8 cm . De acordo com os experimentos realizados por Moreira [1998], em testes de flambagem de elementos de 2 m de comprimento, o bambu, embora cônico, pode ser considerado um tubo prismático, com as propriedades geométricas correspondentes à média das propriedades dos extremos, com erro desprezível.  Para a membrana considerou-se um peso de 0,5 Kgf/m2.  Para os bambus considerou-se um módulo de Young  E = 14000 MPa e  para os cabos E = 100.000 MPa. Para os cabos considerou-se um diâmetro de 8 mm. Para a lâmina d´água de 1 cm de espessura resultou uma sobrecarga. 

Figura 12: Carregamento 1


Figura 13: Carregamento 2

Análise estrutural pelo programa MEF  SAP 2000

Como primeira aproximação e referência para investigações mais aprofundadas foi realizada uma análise estática não linear onde os cabos entraram com tensão inicial igual a zero. A Figura 14 apresenta as forças axiais para o Carregamento 1, de forma qualitativa, visto os resultados serem menos críticos que o Carregamento 2, Figura 15, utilizados para a verificação de estados limites dos elementos e conexões.



Figura 14 : Forças axiais – Carregamento 1




Figura 15: Forças axiais(kN) – Carregamento 2


Obviamente, os bambus foram   comprimidos e alguns cabos foram tracionados, enquanto outros cabos não trabalharam, visto que eles não resistem à compressão e os nós dos trechos correspondentes se aproximaram, relaxando-os. Por não ter sido dada tensão inicial, eles continuaram apresentando tensão igual a zero. Na Figura 15, estão indicadas as forças de compressão críticas nos bambus. A força máxima de tração nos cabos foi igual a 6,29 kN..

 

O Carregamento 2, por ser maior que o Carregamento 1, do mesmo modo, foi mais crítico a momentos fletores, conforme Figuras 16 e 17,  respectivamente.


Figura  16: Momento fletor (kN.m) – Carregamento 2


Figura 17: Momento fletor – Carregamento 1

 

Para verificação das colunas e apoios, bem como dos cabos de ancoragem, tem-se os resultados das Figuras  18 e 19.     .



Figura 18 : Reações de  apoio – (kN) Carregamento1



Figura19 : Reações de apoio – (kN) Carregamento 2

 

Para verificação dos estados limites de utilização, controlam-se os deslocamentos nodais da estrutura, que resultaram conforme Tabela  1.

  

Tabela 1: Deslocamentos nodais

 

Carregamento 1

Carregamento 2

 

Eixos globais

Eixos globais

X(mm)

Y(mm)

Z(mm)

x(mm)

Y(mm)

z(mm)

1

0

0

0

0

0

0

2

-0,3

0,6

-21,4

0,5

-0,8

32,0

3

-0,7

-0,1

0

1,0

0,1

0

4

-2,5

1,7

-3,7

03,7

-2,5

5,6

5

-2,5

0

-6,1

3,7

0

9,1

6

-2,4

0,5

-14,3

3,6

-0,7

21,3

7

-2,4

-0,2

-16,8

3,6

0,2

24,9

8

-2,4

-0,5

-19,9

3,6

0,8

29,5

9

0

0

0

0

0

0

10

0,1

0

-2,0

-0,1

0

2,9

11

0,3

0,4

-6,2

-0,4

-0,5

9,2

12

0,4

-0,3

-4,1

-0,6

0,4

6,1

13

0,5

0

0

-0,8

0

0

14

-0,6

-0,1

-6,7

0,9

0,1

9,5

15

0,4

0,3

-8,8

-0,6

-0,5

13,1

16

1,7

-0,3

-16,7

-2,5

0,5

24,7

17

0,6

0,3

-6,9

-0,9

-0,4

10,0

 

 

 





















VERIFICAÇÕES  DE ESTADOS LIMITES

 

A verificação dos bambus segue as recomendações de Moreira & Ghavami [1997]. A carga limite do tubo, sujeito a uma excentricidade inicial ei e a uma escentricidade acidental ea, desprezando-se a fluência para peças esbeltas e semi-esbeltas, acontece quando as tensões de compressão próximas ao centro do bambu, na zona côncava, atingem o esmagamento das fibras localmente. Neste momento, tem-se normalmente um afundamento local da parede do bambu nesta região. O bambu não é um tubo de parede fina, embora as equações de parede fina apresentem bons resultados para a análise de tensões. Contudo, a instabilidade local não ocorre antes que as tensões atinjam o esmagamento das fibras.      

Para o bambu, um caso aparentemente crítico de compressão  ocorreu no (Carregamento 2), que aplicou uma força de compressão igual a 2,10 kN, em uma barra de 2,0 m de comprimento.  A excentricidade inicial ei da força axial foi  tomada igual à metade do diâmetro do bambu, 5 cm,  pelo fato de que o cabo transmite a força axial ao bambu, paralelamente à sua parede externa. A outra componente do cabo gera momentos fletores em pontos de cruzamento dos elementos, considerados como pontos de travamento do elemento à flambagem. A excentricidade acidental ea mínima para bambus bem selecionados é recomendada igual a  , onde    é o comprimento de flambagem, tomado igual ao comprimento l do trecho analisado.


A condição de segurança para Estados Limites Último exige que as tensões atuantes de cálculo sejam não maiores que as tensões resistentes de cálculo, conforme indicado respectivamente  na Eq.(1).

   (1)

A carga de Euler para os bambus considerados com diâmetro externo De = 10 cm e espessura de parede de 8 mm, considerando-se Eef = 14000 MPa, para o comprimento de flambagem de 2 m , é 8489 kgf. A esbeltez do elemento é 56, que caracteriza um trecho semi-esbelto, que a exemplo da madeira, material também de fibras lignino-celulósicas, optamos por desprezar a fluência. As tensões atuantes são dadas por uma expressão de flexo-compressão, enquanto as tensões resistentes seguem as recomendações Moreira & Ghavami [1997]. Adotando-se a resistência média  à compressão do bambu igual a 40 MPa , sabendo-se que  é a carga de Euler para  o elemento bi-rotulado, I é o momento de inércia da seção; A a área da seção transversal e Nd a ação de cálculo da barra, tem-se a Eq. (2), que expressa a segurança em flexo-compressão:

     (2)



     OK!

Salienta-se que bambus estruturais dos gêneros  Guadua e Phyllostachys  satisfazem aos valores de resistência e geometrias adotadas. Outro trecho crítico tem uma força de  compressão 639 kgf para um comprimento destravado de 1,2 m. Para este segmento, a esbeltez média é 36. Neste caso o termo correspondente à flexão torna-se menos significativo, mas tem-se uma tensão atuante um pouco maior, igual a 44,7  , ainda inferior à resistência de cálculo. Este resultado é interessante e mostra que a verificação de flexo-compressão em elementos de bambus não deve ser desprezada, mesmo para baixa esbeltez, pois os segmentos de bambu, de um modo geral, têm uma imperfeição de eixo significativa.


A tração máxima  de cálculo no cabo é de  6,29 kN, absorvidas com segurança por cabos poliéster ou cabos de poliamida e polipropileno de 12 mm de diâmetro. Por outro lado, a força máxima de reação no apoio é de 3,81 kN,  Figura 19, que se dividirá para dois bambus com ângulo interno de 62,6 graus, o que dá uma força de pull-out  no solo de 2,16 kN . Os bambus e estais  podem ancorar-se ao solo de forma a  utilizar o próprio peso do solo para evitar o pull-out. As forças nos tirantes, relativamente baixas em relação às forças na estrutura da concha, podem ser avaliadas aplicando-se forças de arrasto atuantes sobre a área da concha projetada em planos verticais, um plano contendo o  eixo longitudinal e outro contendo o transversal.


Finalmente, deve-se investigar o corte da bandagem na linha adesiva com o corpo do bambu. Neste caso a superfície adesiva é cilíndrica com diâmetro igual ao diâmetro externo do bambu e comprimento mínimo de colagem a ser dimensionado a partir da tensão aderente de cálculo e da força de corte atuante.

A força de corte é a força máxima no cabo,  decomposta na direção do eixo do bambu. Tendo-se em consideração que a tensão aderente natural entre as fibras do bambu, por tração normal às fibras, é em média 3 MPa , consideremos que esta cola natural seja duas vezes mais resistente que a cola artifical. Tomemos então: - a resistência média aderente bambu-tecido e  entre as camadas do tecido em bandagem, igual a 1,5 MPa, com coeficiente de segurança igual a 2; a força máxima no cabo de 629 kgf e o ângulo entre a barra e o cabo igual a 50 o. Se lc   é o comprimento de colagem, tem-se a desigualdade de segurança: - a tensão de cisalhamento entre o bambu e a cola deve ser menor ou igual à tensão aderente de cálculo.







OK!


CONCLUSÃO

O que se pretende mostrar nas investigações interdisciplinares que temos realizado, é que conceber, analisar e construir, são momentos inseparáveis de uma mesma atividade, quando o objetivo é uma síntese coerente, um objeto sintaticamente coerente, que coordene e subordine materiais e formas de maneira adequada aos domínios semânticos considerados relevantes, de forma que o objeto, funcionando corretamente, possa desempenhar a sua função prevista e entrar em uso coletivo. Não importa, se em termos de definição, um desses momentos seja considerado científico, proto-científico ou não científico. Ciência são métodos e teorias. Talvez nem seja interessante que todos os momentos de uma atividade de pesquisa sejam enquadrados em métodos científicos. Isto poderia empobrecer a formação das pessoas, que têm dimensões e tempos diversos que poderiam atrofiar-se, por não serem exercitados.

 

Se uma inovação surge e pode ser facilmente apropriada pela comunidade, atendendo aos requisitos funcionais de uso, resistência e durabilidade, pelo menos um importante  objetivo da investigação  foi atingido.  E neste caso, a estrutura auto-tensionada com bambus e cabos, como demonstrado pela análise e  avaliações de estados limites, atende perfeitamente às exigências de Engenharia de Estruturas, abrindo um enorme leque de aplicações estruturais para os mais diferentes objetos. Móveis, estantes, passarelas, dentre outros, podem utilizar o mesmo princípio estrutural e soluções construtivas propostas. Conceitos de leveza e energia mínima, conforme propostos por Beukers & Hinte [1999] e Otto [1989, são atendidos por estas estruturas, principalmente pela utilização do bambu, que tem um alto valor estrutural  descrito pela razão resistência/peso, além de ser um recurso renovável cuja principal energia de produção é a energia livre da luz solar.

 

Ligações amarradas entre elementos evitam a introdução de momentos de torção, oriundos de possíveis excentricidades, o que é totalmente favorável ao desempenho mecânico  dos bambus. Nas extremidades dos bambus deve ser dado um acabamento, de forma a evitar que arestas vivas cortem o material de vedação. Neste caso, apenas estas pontas dos bambus teriam um contato indireto com a membrana de vedação. Como se sabe, elementos de pequena espessura não têm inércia térmica, transferindo rapidamente o calor absorvido pelo material, para o volume interno da cobertura. Neste caso, os bambus, protegidos do contato com a membrana, não correm risco de se racharem por superaquecimento diferencial. Para a fixação dos cabos nas extremidades, poderiam ser imaginados diversos tipos de nós. Neste artigo, visando acessibilidade, facilidade construtiva e baixo custo,  realizou-se  uma  solução mais simples, ou seja, a amarração. Este sistema estrutural, por todas as suas características construtivas e materiais utilizados, é também uma solução sismo-resistente.

 

Experimentos aerodinâmicos em túneis de vento seriam os mais recomendados para futuros trabalhos, juntamente com análise estrutural dinâmica, linear e não-linear geométrica.

AGRADECIMENTOS

 

Os autores agradecem ao CNPq pelo financiamento da pesquisa, processo CT Agro 574.694 2008/0, bem como aos alunos do LILD e à *BAMBUTEC, pelas atividades de pesquisa que conduziram aos primeiros modelos e protótipos, os quais inspiraram as atuais investigações. Nossos agradecimentos também ao bolsista DTI Daniel Mariano, EEUFMG, pelas atividades de constituição dos modelos construtivo-processuais da concha.

 

*BAMBUTEC – Empresa de Eventos da Cidade do Rio de Janeiro e parceira do projeto CNPq, mencionado neste artigo.

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