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Edições Anteriores 256 Educação, democracia e demagogia
Educação, democracia e demagogia PDF Imprimir E-mail
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Escrito por Nilton Bruno Tomelin   
Qua, 19 de Janeiro de 2011 00:00

O analfabetismo é um tema recorrente nos mais variados espaços de debate quando se deseja refletir sobre políticas públicas ligadas à educação. Como se sabe a gestão de políticas públicas é determinada pelas escolhas que as pessoas fazem, quando convocadas a votar. Portanto, a discussão sobre políticas públicas para erradicação do analfabetismo é também uma questão de democracia. Por sua vez a compreensão do conceito de democracia exige pessoas críticas, sensíveis e alfabetizadas. Trata-se pois de um ciclo.

Analisando a problemática deste ciclo, percebe-se inicialmente que nos defrontamos com um dos dramas mais vergonhosos que acomete parte da população brasileira. O fato de não saber ler ou escrever o próprio nome é algo que não pode ser compreendido como fruto do acaso ou algo “naturalmente” justificável. Analisado numericamente percebemos que o analfabetismo atinge a cifra dos 14 milhões de pessoas acima de 15 anos de idade. Outros 34 milhões de brasileiros sabem soletrar e desenhar algumas palavras mas não conhecem seu significado, caracterizando-se como analfabetos funcionais. Somados são cerca de 48 milhões brasileiros vivendo num outro mundo, sombrio, misterioso.

Se considerarmos o fato de que estes brasileiros estão na faixa etária em que é permitido votar, conclui-se que correspondem a cerca de 35,5% do eleitorado brasileiro. Assim mais de um terço dos votos está nas mãos de quem não conseguirá discutir com profundidade a melhor opção para o seu futuro num momento decisivo como ocorre em tempos de eleição. Portanto, a democracia brasileira é construída em alicerces de alto risco, pouco seguros. Não pela falta de caráter do eleitor analfabeto. Ao contrário é sabido que muitas pessoas nesta condição podem nos dar belas lições de vida, munidos de valores, sensibilidade e ética. Mas se estas pessoas detivessem também uma formação mínima adequada, poderiam decidir com maior segurança, por isso com maiores chances de acertar.

Assim, mais do que interpretação matemática, este problema exige uma análise mais profunda e complexa. Assim, pode-se dizer que mais grave é fato de que estas pessoas são incapazes de se comunicar e de se fazer ouvir. Permanecem num silêncio ensurdecedor e são por isso, facilmente manipulados por estratégias de propaganda que os transformam em meros bonecos de ventríloquos. Preocupa o fato de que diante desta constatação não se vislumbram políticas públicas que acabem definitivamente com este problema.

Antes de questionar os motivos reais por que ninguém se compromete efetivamente na resolução deste problema vamos apresentar alguns números. Segundo o professor e senador Cristóvam Buarque, se adotássemos o Método Paulo Freire de alfabetização, cada pessoa poderia ser alfabetizada em cerca de 45 dias. Em relação a isso é preciso dizer que este método já foi elaborado e aprovado nos anos de 1960, mas abortado com a Revolução de 1964.

Segundo o professor Cristóvam cada aluno, para ser alfabetizado, custaria cerca de R$ 300,00. Considerando os 48 milhões de brasileiros que deveriam dispor do direito de serem alfabetizados seriam necessários R$ 10,2 bilhões. Parece um valor exorbitante, mas veremos que não é bem assim. Segundo a revista Exame, o governo federal arrecadou em 2009, cerca de R$ 698 bilhões. Assim, o valor necessário para erradicar o analfabetismo no Brasil corresponde a 1,46% do que é arrecadado num único ano (isto apenas na esfera federal).

Além disso, é preciso dizer que este gasto acorrerá apenas uma vez e em etapas. Assim, por exemplo, se um presidente da república quiser poderá utilizar cerca 0,4% da arrecadação anual ao longo de seu mandato e poderá entregar uma nação com toda a sua população lendo e escrevendo. Diante disto é preciso analisar com mais profundidade o problema. Manter esta legião de alienados serve aos interesses de quem? Será que há quem acredite que existem pessoas que não desejam ou não são capazes de aprender a ler e escrever? Usando e velha metáfora, por que nossos dirigentes preferem prometer o peixe pronto a se comprometer a ensinar as pessoas a pescar?

Enfim, a democracia será construída partindo de princípios e garantias elementares. Ler, escrever, comer, vestir e conviver em paz, são direitos inquestionáveis mas que foram negados ao longo de séculos de história. Assim como grandes tragédias comovem, a tragédia do analfabetismo deveria sensibilizar a nação. Os números mostram que reivindicar a erradicação do analfabetismo, não representa desejar o impossível. É apenas exigir que a nação do futuro seja construída sobre alicerces seguros e sólidos.

Enquanto algo elementar como saber ler e escrever for um sonho, uma utopia, não temos o direito de projetar o futuro. por mais aprazível que seja sonhar e por mais confortável que seja o “berço esplêndido” em que nos encontramos, é preciso acordar! Os séculos de dormência nos conduziram a um perigoso estado de passividade sobre o qual construímos nossa democracia. Uma democracia que se confunde com demagogia, pois centenas de propostas são apresentadas sem um devido comprometimento de seus autores. Soluções mágicas são apresentadas sem dizer como, com que recursos e em que circunstâncias tais propostas serão executadas. É preciso uma grande revolução na educação e na democracia.

A grande revolução democrática não comporta golpes políticos, perseguições ou imolações. Trata-se de uma revolução contra o conformismo, a estagnação e a aceitação passiva da negação de direitos. Se a matemática prova que acabar com o analfabetismo representa um investimento ínfimo, é preciso que sensibilidade, coragem e vontade política se juntem pela dignidade de todos os brasileiros e brasileiras. Por sua vez, a educação, é o espaço onde estes valores são construídos através de discussões em que os diferentes sejam respeitos, no melhor do espírito democrático. Afastar o conceito de democracia do de demagogia, é um constante exercício de cidadania. Assim, acabar com o analfabetismo, embora não pareça ser prioridade, exige comprometimento dos eleitos e dos eleitores. Aos eleitos o compromisso de fazer a sua parte e aos eleitores a incumbência de erradicar o analfabetismo e a demagogia.

 
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