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Gêneros Textuais: Instrumento para o Desenvolvimento da Competência Textual do Educando PDF Imprimir E-mail
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Escrito por Adriano Ribeiro da Costa   
Qua, 30 de Novembro de 2011 00:00

RESUMO


Este artigo objetiva refletir sobre o ensino de produção de textos baseado em gêneros textuais, a fim de instrumentar os professores em sua prática pedagógica no que se refere ao ensino da escrita, ou seja, ao desenvolvimento da competência textual dos educandos. A pesquisa orientou-se em estudos realizados sobre gêneros textuais na área da Linguística Textual. Observou-se que os gêneros textuais são uma ferramenta importante para o desenvolvimento da competência textual dos estudantes.

Conclui-se, então, que os professores precisam utilizar os gêneros textuais em suas aulas de forma a desenvolver a competência textual dos estudantes, para que estes possam participar ativamente das práticas sociais em que a escrita é requerida.
Palavras-chave: Gêneros textuais, competência textual, ensino.
ABSTRACT
This article aims to reflect on the teaching of production of texts based on textual genres, in order to guide the teachers in their pedagogical practices concerning the teaching of the writing skill, that is, to the development of the textual competence of the learners. The research was based on studies done about textual genres at the Textual Linguistics area. It was observed that the textual genres are an important tool for the development of the textual competence of the students. It is concluded, then, that the teachers need to use textual genres in their classes to develop the student’s textual competence, so that he or she can participate actively of social practices where the writing is required.
Keywords: Textual genres, textual competence, teaching.

 


INTRODUÇÃO
Em especial, a partir da década de 1980, começou-se a repensar o ensino da escrita, buscando-se uma nova orientação: sair de um ensino mecânico e descontextualizado. Uma nova forma para efetivar um aprendizado funcional e contextualizado da escrita foi através de trabalhos com os gêneros textuais.
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A teoria dos gêneros textuais, presente explicitamente nos Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN) de Língua Portuguesa, vem orientando o processo de ensino-aprendizagem da escrita. Essa teoria está diretamente relacionada à linguagem, e a concepção vigente de linguagem dos PCN é a de Bakhtin, que ressalta o caráter dialógico da língua. Essa concepção bakhtiniana da linguagem norteia as teorias atuais, fundamentando a base teórico-metodológica do ensino de língua materna em todos os níveis.
É consenso hoje em dia entre os linguistas que o ensino-aprendizagem da escrita só pode ser realmente produtivo se for por meio dos gêneros textuais, pois é através do domínio dos gêneros que circulam socialmente que o educando pode participar ativamente das práticas sociais de sua comunidade, isto é, pode exercer a sua cidadania. Concepção essa já presente nos PCN de Língua Portuguesa, documento que norteia o ensino da língua materna.
Por isso, entende-se que se faz necessária uma reflexão sobre o ensino de produção de textos baseado em gêneros textuais, a fim de instrumentar os professores em sua prática pedagógica no que se refere ao ensino da escrita, ou seja, ao desenvolvimento da competência textual dos educandos.
1. REFLETINDO SOBRE A PRÁTICA DE PRODUÇÃO DE TEXTOS
No intuito de mudar a realidade do fracasso do uso da escrita pelos estudantes, as instituições governamentais têm empreendido uma série de ações em prol de uma escola mais formadora e eficiente. Uma dessas medidas é a publicação dos Parâmetros Curriculares Nacionais de Língua Portuguesa, documento que tem como objetivo servir de referencial para a prática pedagógica do professor em relação ao ensino da língua materna.
Porém, infelizmente, ainda hoje, pode-se constatar, no que se refere às atividades de produção de textos, por parte de alguns professores: 1 – uma prática de uma escrita mecânica e periférica, centrada nas habilidades motoras de produzir sinais gráficos e na memorização de regras ortográficas; 2 – uma prática de uma escrita artificial e inexpressiva, realizada em exercícios de criar listas de palavras soltas ou de formar frases; 3 – uma prática de uma escrita sem função, destituída de qualquer valor interacional, sem autoria e sem recepção, entre outras.
Esse quadro só será mudado quando os professores conceberem a atividade da escrita como uma atividade interativa, que supõe parceria, envolvimento entre indivíduos, a
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fim de que ocorra a comunhão das ideias, das informações e das intenções pretendidas. Também devem entender que a escrita existe para cumprir diferentes funções comunicativas, pois, na sociedade, não existe a escrita “para nada”, “para não dizer”, “para não ser ato de linguagem”. E essas funções comunicativas só serão realizadas, ou melhor dizendo, concretizadas, por meio de algum gênero textual. Pois, como afirma Schneuwly (citado por KOCH, 2002, p. 55) “o gênero pode ser considerado como ferramenta, na medida em que um sujeito – o enunciador – age discursivamente numa situação definida – a ação – por uma série de parâmetros, com a ajuda de um instrumento semiótico – o gênero.” Assim, o ensino dos gêneros seria uma forma concreta de dar aos educandos a possibilidade de participar ativamente das práticas sociais em que a escrita é requerida, isto é, de lidarem com a língua em seus mais diversos usos autênticos no dia a dia.
E para que o trabalho de produção de textos seja realmente feito nessa perspectiva pelos professores, é necessário, antes de tudo, que eles entendam o que sejam os gêneros textuais.
2. GÊNEROS TEXTUAIS
Hoje em dia, há diversos trabalhos sobre gêneros textuais, e a maioria deles remete a Bakhtin. Foi a partir dos estudos desse autor (nos anos 50) que a linguística veio a se interessar pelo assunto; antes eram estudos literários e retóricos que se interessavam pelos gêneros.
Bakhtin propõe uma teoria baseada nos usos da linguagem. Ele se opõe à visão tradicional da teoria da comunicação, que excluía o interlocutor, rejeita o enfoque monológico e mostra que o papel do interlocutor é tão ativo quanto do locutor no processo de comunicação. Assim, para ele, há uma relação direta entre o papel do locutor e o do interlocutor, pois ambos emitem e compreendem enunciados.
A concepção de língua de Bakhtin é baseada no dialogismo, na interação humana; isto é, a língua é construída no dia a dia, num contexto social, no diálogo entre os indivíduos pertencentes a uma mesma esfera social; como ele mesmo afirma:
A verdadeira substância de língua não é constituída por um sistema abstrato de formas linguísticas nem pela enunciação monológica isolada, nem pelo ato psicofisiológico de sua produção, mas pelo fenômeno social da interação verbal, realizada através da enunciação ou das enunciações (grifo do autor).
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A interação verbal constitui, assim, a realidade fundamental da língua. (BAKHTIN, 2002, p. 123).
A partir dessa breve apreciação da concepção de língua de Bakhtin, fica mais clara a compreensão da noção de gênero que virá em seguida.
2.1 Os gêneros textuais segundo Bakhtin1 Conforme Bakhtin ([1979] 2000, p. 279), cada esfera da atividade humana elabora um variado número de gêneros, que refletem as condições específicas e as finalidades de cada uma dessas esferas. Esses gêneros distinguem-se uns dos outros por seu conteúdo temático (assunto gerado numa esfera discursiva com suas realidades sócio-culturais), estilo verbal (recursos lexicais, fraseológicos e gramaticais) e por sua construção composicional (a forma, que torna possível o reconhecimento do gênero, embora não defina a sua completude). Essas três dimensões, apesar de possuírem características específicas, fundem-se compondo o gênero. Portanto, são indissociáveis e não há predomínio de uma sobre a outra. Essa diversidade de gêneros é determinada pelas várias formas típicas de dirigir-se a alguém e as diversas concepções do destinatário. E a escolha de um gênero é determinada pela esfera discursiva, as necessidades da temática, o conjunto dos participantes e a vontade enunciativa ou intenção do locutor. Assim, os gêneros textuais são tipos relativamente estáveis de enunciados que cada esfera de utilização da língua elabora; e essa estabilidade relativa torna os gêneros passíveis de mudança ao longo do processo histórico-social. E eles são imprescindíveis à comunicação humana, como afirma Bakhtin ([1979] 2000, p. 302) “se não existissem os gêneros do discurso e se não os dominássemos, se tivéssemos de criá-los pela primeira vez no processo da fala, se tivéssemos de construir cada um de nossos enunciados, a comunicação seria quase impossível”. Para Bakhtin, os gêneros têm as mesmas propriedades do enunciado; por isso ele ora se refere a enunciado, ora a gênero. E para ele, os enunciados (gêneros) apresentam cinco características constitutivas: 1 São delimitados pela alternância dos sujeitos falantes: como ocorre naturalmente nos diálogos, e também nos gêneros escritos, porém, não de forma natural. Neste caso, o produtor imagina prováveis perguntas do interlocutor com suas respectivas respostas, visando suprir a ausência do interlocutor imediato. Assim, essa delimitação é dada pela resposta do interlocutor presente (real) ou ausente (fictício);
1 Na realidade, Bakhtin não adota essa terminologia. Ele formula sua teoria sob a denominação de Gênero do discurso. Porém, por uma questão de uniformidade terminológica, adota-se aqui a classificação Gênero textual.
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2 Têm acabamento específico: esse acabamento é determinado por três fatores: a) tratamento exaustivo do objeto do sentido – varia conforme as esferas da comunicação verbal, ocorrendo com mais frequência nos gêneros padronizados ao máximo, em que a criatividade é quase inexistente, do que nos gêneros utilizados nas esferas criativas; b) o intuito, o querer-dizer do locutor – favorece o reconhecimento do acabamento do enunciado pelo interlocutor; c) as formas típicas de estruturação do gênero do acabamento – dependem da esfera da comunicação verbal, do tema, das circunstâncias, da posição social e do relacionamento pessoal dos participantes da comunicação; 3 São marcados pela intenção do locutor: essa intenção revela o propósito discursivo do locutor, projeta as marcas da individualidade de alguém que defende um ponto de vista ao se envolver com um tema; 4 Intertextualidade: os enunciados mantêm relações dialógicas com o que vem antes e com o que vem depois. Numa interação verbal, retoma-se enunciados de outros, mesmo que não seja explicitamente; 5 Têm um destinatário: isso influencia na escolha, por parte do locutor, do gênero, dos procedimentos composicionais e dos recursos linguísticos. Bakhtin distingue dois tipos de gêneros textuais: o primário (simples) e o secundário (complexo). O primeiro diz respeito aos gêneros que se apresentam em uma comunicação verbal espontânea; enquanto que o segundo tipo se relaciona aos gêneros que aparecem em uma comunicação cultural mais complexa e relativamente mais evoluída, principalmente escrita. Assim, a contribuição de Bakhtin em relação aos gêneros textuais está exatamente em considerá-los como uma criação de indivíduos que pertencem a uma determinada esfera de comunicação, que compartilham objetivos comuns. Esses objetivos comuns se revelam nos gêneros, que podem pertencer à modalidade oral ou à escrita. Dessa forma, a classificação de textos orais e escritos como pertencentes a um determinado gênero é determinada pelo objetivo comunicativo de cada esfera de atividade. E como essas esferas têm objetivos distintos no decorrer dos tempos, os gêneros têm caráter não estático; por isso, a visão de Bakhtin sobre a análise de gêneros não é dogmática, normativa, mas descritiva. Em outras palavras, para Bakhtin, a estrutura social da qual fazem parte os interlocutores é uma fonte criadora de gêneros. E as especificidades de cada esfera de comunicação são reveladas na superfície linguística destes. A contribuição de Bakhtin é essencialmente de natureza teórica, por isso tem-se a necessidade de buscar em outros autores subsídios para o trabalho com os gêneros textuais. 2.2 Os gêneros textuais segundo Bronckart A noção de gênero de Bronckart é fundamentada em princípios formulados por vários autores, dentre os quais está Bakhtin (2000). Bronckart (1999, p. 91) afirma que a situação de ação
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de linguagem se refere às propriedades dos mundos formais, entendidos esses mundos como os mundos físicos, social e subjetivo, que podem exercer influência sobre a produção textual. Essa situação de ação de linguagem pode ser tanto externa como interna. A primeira seria as características dos mundos formais, tais como uma comunidade de observadores poderia descrever. A segunda seria as representações sobre esses mesmos mundos, tais como um agente as interiorizou. E é realmente esta segunda situação que influi sobre a produção de um texto empírico, isto é, de um gênero. As relações entre uma situação e um texto empírico nunca podem apresentar um caráter de dependência direta ou mecânica. Primeiro, porque não se tem acesso às representações específicas que o produtor do texto dispõe sobre si mesmo; segundo, porque, ainda que se dispusesse de um conhecimento exaustivo da situação de ação interiorizada pelo produtor, isso não permitiria, de forma alguma, que se pudesse prever o conjunto das características do texto empírico produzido. Como afirma Bronckart (1999, p. 92), para produzir um texto, o produtor deve mobilizar algumas de suas representações sobre os mundos. Essa mobilização é feita em duas direções distintas: em relação ao contexto de produção textual e em relação ao conteúdo temático ou referente. O contexto de produção se refere ao conjunto dos parâmetros que podem exercer uma influência sobre a forma como um texto é organizado. Esses fatores se referem ao mundo físico e ao mundo social e ao subjetivo. No primeiro caso, todo texto é o resultado de um ato realizado em um contexto “físico” (no espaço e no tempo). Esse mundo físico é definido por quatro parâmetros: l- lugar de produção (lugar físico onde o texto é produzido); 2- o momento de produção (a extensão do tempo durante a qual o texto é produzido); 3- o emissor (a pessoa que elabora o texto, ou na modalidade oral ou na modalidade escrita); 4- o receptor (a(s) pessoa(s) que recebe(m) concretamente o texto). No segundo caso, todo texto é inscrito no quadro das atividades de uma formação social, que implica o mundo social e o subjetivo. Esse mundo sócio-subjetivo é decomposto em quatro parâmetros: l- lugar social: em que modo de interação o texto é produzido; 2- a posição do emissor: que papel social o emissor desempenha na interação em curso; 3- a posição social do receptor: papel social atribuído ao receptor do texto; 4- objetivo da interação: que efeito o enunciador quer produzir no destinatário através do texto. Já o conteúdo temático de um texto se refere ao conjunto de informações que nele são explicitamente apresentadas. Esses conhecimentos variam em função da experiência e do nível de desenvolvimento do produtor. Tanto o contexto de produção quanto o conteúdo temático integram a noção de ação de linguagem, que consiste em identificar os valores precisos que o produtor atribui a cada um dos parâmetros do contexto aos elementos do conteúdo temático mobilizado. Assim, a ação de linguagem
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seria uma base de orientação a partir da qual o produtor deve tomar um conjunto de decisões. E uma dessas decisões que o produtor toma é a escolha do gênero de texto que lhe parece o mais adequado e eficaz em relação à sua situação de ação específica. Segundo Bronckart, o gênero está intrinsecamente ligado à dimensão sócio-histórica da língua. Em decorrência de necessidades específicas, os indivíduos, que se reúnem em grupos sociais em função de objetivos comuns, elaboram textos, que são construídos tendo como suporte os gêneros disponíveis. E, por causa de características diferentes dos indivíduos (grau de instrução, classe social, faixa etária, profissão etc.), os textos se manifestam de forma variada; daí porque estes apresentam características relativamente estáveis. O quadro teórico dos gêneros proposto por Bronckart compreende três níveis de análise: l- infra-estrutura: (plano geral: conteúdo temático; tipos de discurso: discurso teórico, narração etc.; sequências: narrativa, explicativa etc.); 2- mecanismos de textualização (conexão: conjunções, advérbios ou locuções adverbiais, grupos preposicionais e segmentos de frases; coesão nominal: hiperônimo, expressões definidas, mesmo item lexical etc.; coesão verbal: tempos verbais); 3- mecanismos enunciativos (distribuições de vozes: vozes do autor, sociais etc.; modalizações: lógicas, deônticas etc.). Pode-se observar que a visão de Bronckart dos gêneros se aproxima das ideias de Bakhtin, pois o princípio fundamental do sócio-interacionismo é o lugar e o meio em que os indivíduos interagem socialmente; característica presente na teoria daquele. O mérito do trabalho realizado por Bronckart sobre os gêneros foi de natureza empírica, e não só teórica; ao contrário de Bakhtin, cujo trabalho é essencialmente teórico. Bronckart desenvolve uma análise que focaliza os tipos de sequências textuais e, por meio delas, as regularidades dos parâmetros linguísticos de textualização e os mecanismos enunciativos, que caracterizam os gêneros textuais. Porém, ele vai além dos constituintes internos dos textos, pois considera também o contexto, as situações de produção e o efeito que eles exercem sobre seus receptores. 2.3 Os gêneros textuais segundo Marcuschi Para Marcuschi (2002, p. 22), é impossível se comunicar verbalmente a não ser por algum gênero, assim como é impossível se comunicar verbalmente a não ser por algum texto. Assim, a comunicação verbal só é possível por algum gênero textual. E para ele, “gêneros são formas verbais de ação social relativamente estáveis realizadas em textos situados em comunidades de práticas sociais e em domínios discursivos específicos” (2002, p. 25). Os gêneros são diversos, tais como: telefonema, sermão, carta comercial, carta pessoal, romance, bilhete, reportagem jornalística, aula, notícia jornalística, horóscopo, receita culinária, bula de remédio, instrução de
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uso, etc. Assim, existem tantos gêneros textuais quantas as situações sociais convencionais onde são usados em suas funções também convencionais. Os gêneros contribuem para ordenar e estabilizar as atividades comunicativas do dia a dia, porém não são instrumentos estanques e enrijecedores da ação criativa. Para Marcuschi (2002, p. 29), “quando dominamos um gênero textual, não dominamos uma forma linguística e sim uma forma de realizar linguisticamente objetivos específicos em situações sociais particulares”. Essa visão privilegia não o aspecto formal e estrutural da língua, mas sim sua natureza funcional e interativa. Marcuschi (2000, p. 118-122) propõe uma abordagem dos gêneros textuais por domínio discursivo e modalidades. O domínio discursivo seria “uma esfera social ou institucional (religiosa, jurídica, jornalística, política, industrial, familiar, lazer, etc.) na qual se dão práticas que organizam formas de comunicação e respectivas estratégias de compreensão”. Esses domínios discursivos seriam responsáveis pela produção de modelos de ação comunicativa que se estabilizam e se transmitem de geração para geração com propósitos e efeitos definidos e claros. Eis os domínios discursivos citados por Marcuschi: científico, jornalístico, religioso, saúde, comercial, industrial, instrucional, jurídico, publicitário, lazer, interpessoal, militar e ficcional. Quase todos os domínios discursivos apresentam mais gêneros da modalidade escrita que na oral, com exceção do domínio discursivo religioso. Para Marcuschi, seria impossível se comunicar sem ser por algum gênero textual situado em algum domínio discursivo, cujo objetivo é funcionar como enquadre global da superordenação comunicativa, subordinando práticas sócio-discursivas orais e escritas que resultam nos gêneros que circulam nesses domínios. Quanto às modalidades, os gêneros podem ser expressos na modalidade oral e escrita. Para Marcuschi (2001, p. 37), porém, “as diferenças entre fala e escrita se dão dentro do continuum tipológico das práticas sociais da produção textual e não na relação dicotômica de dois polos opostos”. Assim, a visão dele da relação fala e escrita não é dicotômica. Ele afirma que: O contínuo dos gêneros textuais distingue e correlaciona os textos de cada modalidade (fala e escrita) quanto às estratégias de formulação que determinam o contínuo das características que produzem as variações das estruturas textuais discursivas, relações lexicais, estilo, grau de formalidade etc., que se dão num contínuo de variações, surgindo daí semelhanças e diferenças ao longo de contínuos sobrepostos. (2001, p. 42)
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Exemplificando, poderia haver gêneros escritos com características da fala, como uma carta pessoal; ou gêneros orais com características próprias da escrita, como uma conferência universitária preparada com cuidado. Assim, na visão de Marcuschi, tanto a fala como a escrita apresentam um continuum de variações, e a comparação deve tomar como critério básico de análise não uma visão dicotômica estrita, mas uma relação fundada no continuum dos gêneros textuais. A perspectiva de Marcuschi sobre os gêneros baseia-se na situação de interação, nos participantes e no propósito comunicativo dos textos; para ele, as situações de interação favorecem a constituição dos gêneros. Assim, pode-se afirma que a teoria dele é também sócio-interativa, coadunando-se com a perspectiva de Bakhtin.
3. IMPLICAÇÕES PARA O ENSINO DA ESCRITA
O reconhecimento de que os gêneros são objeto e ferramenta de trabalho para o desenvolvimento da capacidade textual do educando e de sua efetiva participação social em práticas que envolvam a escrita está explícito no texto direcionado para o ensino de Língua Portuguesa, contido nos Parâmetros Curriculares Nacionais, como se pode observar:
O uso (da língua) depende do conhecimento sobre o dito/escrito (a leitura/análise), a escolha de gêneros e tipos de discurso. Tais escolhas refletem conhecimento e domínio de “contratos” não declarados, mas implícitos. Tais contratos exigem que se fale/escreva daquela forma, segundo este ou aquele modo/gênero. Disso saem as formas textuais (1999, p. 45).
Quais são as implicações de tudo isso para o ensino da escrita? A análise aplicada de gêneros, ao contrário de muitas outras estruturas analíticas, não é estática nem prescritiva. Potencialmente, ela é dinâmica e descritiva. Cabe ao professor de língua portuguesa usá-la do modo que desejar, ou para uma exploração inovadora dos recursos genéricos ou para uma exposição limitada dos contextos genéricos padronizados. Embora seja essencial para o estudante a familiaridade com as convenções genéricas especificamente associadas a um contexto profissional particular, não é necessário nem desejável restringir a experiência do comportamento linguístico apenas aos aspectos convencionais e padronizados da construção e uso dos gêneros.
Como é possível usar de criatividade no ensino-aprendizagem da escrita baseado em gêneros textuais? Uma vez que a análise de gêneros fornece uma descrição sólida do
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comportamento linguístico em contextos profissionais, é possível introduzir uma boa dose de criatividade no ensino da escrita, adaptando os propósitos comunicativos, a natureza da participação em um dado contexto comunicativo, a relação social e profissional entre os participantes de um exercício de construção de gênero qualquer e, acima de tudo, apresentando a variabilidade no uso de estratégias genéricas para o alcance de propósitos comunicativos similares.
Todos os gêneros, primários ou secundários, envolvem regularidade e, portanto, essas regularidades devem ser aprendidas por qualquer um que alimente a mínima ambição de participar de uma comunidade disciplinar especializada. Como afirma Bakhtin ([1979] 2000, p. 80), “(...) para usá-los livremente, é preciso um bom domínio dos gêneros”. No entanto, para fazer disso uma realidade, o primeiro pré-requisito é estar consciente do conhecimento convencional situado dentro de um gênero disciplinar específico ou dentro de um “sistema de gêneros”.
Assim, o professor só conseguirá desenvolver a competência textual dos educandos se utilizar os gêneros textuais em suas atividades de produção de textos. Atividades estas que devem ter as seguintes características: 1 – uma escrita de autoria dos educandos, pois eles são um dos lados da interação verbal; 2 – uma escrita de textos socialmente relevantes e funcionalmente diversificados; 3 – uma escrita de textos com leitores, pois estes são o outro lado da interação verbal; 4 – uma escrita adequada tanto em relação ao contexto comunicacional quanto em relação a sua forma de apresentação.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Diante do exposto, pode-se concluir que os gêneros textuais são um instrumento importante para que o professor possa desenvolver a competência textual de seus educandos, ou seja, o professor deve ter como objetivo levar os estudantes a dominarem os gêneros, a fim de produzi-los tanto na escola como, principalmente, fora dela.
Acredita-se que a discussão feita neste estudo sobre os gêneros poderá trazer contribuições importantes para a mudança da forma de tratamento da produção de textos na escola.
Porém, isso só será possível se o professor colocar os estudantes em situações de comunicação o mais próximo possível das situações reais do uso dos gêneros. Significa dizer
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que as atividades de produção dos diversos gêneros que circulam socialmente devem fazer sentido para os estudantes.


REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
BAKHTIN, Mikhail. Estética da criação verbal. 3. ed. São Paulo: Martins Fontes, [1979] 2000. pp. 279-326.
BAKHTIN, M./VOLOCHÍNOV, V. N. Marxismo e filosofia da linguagem. 9. ed. São Paulo: Hucitec, [1929] 2002.
BRASIL, Secretaria de Educação e Desporto. Parâmetros Curriculares Nacionais: Língua Portuguesa - v. 2, 1999.
BRONCKART, Jean-Paul. Atividade de linguagem, textos e discursos: por um interacionismo sócio-discursivo. São Paulo: EDUC, 1999.
KOCH, Ingedore Villaça. Desvendando os segredos do texto. São Paulo: Cortez, 2002.
MARCUSCHI, Luiz Antônio. Gêneros textuais: o que são e como se constituem. Recife: Universidade Federal de Pernambuco, (Mimeo), 2000.
______. Da fala para a escrita: atividades de retextualizações. 3. ed. São Paulo: Cortez, 2001.
______. Gêneros textuais: definição e funcionalidade. In: DIONÍO, A.; MACHADO, A. R.; BEZERRA, M. A. (orgs.). Gêneros textuais e ensino. Rio de Janeiro: Lucerna, 2002.

 

Gêneros Textuais: Instrumento para o Desenvolvimento da Competência Textual do Educando
Adriano Ribeiro da Costa
Instituto Federal de Pernambuco – IFPE/ DEaD e Campus Caruaru
Professor de Português e Inglês Instrumental
Faculdade Sete de Setembro – FASETE
Professor de Linguística e Coordenador da Pós-graduação de Letras

 

Autor deste artigo: Adriano Ribeiro da Costa - participante desde Sáb, 11 de Março de 2006.

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