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Edições Anteriores 94 Avaliação da aprendizagem - aferição ou troca?
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Escrito por Maria Ceres Rodrigues Murad   
Qua, 10 de Maio de 2006 21:00

"Todos dizem que o Brasil é um país sem memória. Parece que a coisa vai piorar... A nova moda no Ensino Superior é que os alunos sempre consultem a bibliografia na hora de fazer provas. Nada contra esta prática, pois ela faz com que o aluno recorra à pesquisa bibliográfica - e isso é muito bom! Só penso que se banirmos completamente o exercício da memória estaremos ´atrofiando´ um componente fundamental para o bom funcionamento do cérebro de qualquer pessoa: a memória". Willie Muriel Cardoso (Forum PCCC em 21/05/05)



Essa reflexão instigante nos remete a uma questão que é central no debate educacional : o perfil da avaliação da aprendizagem - seus critérios e propósitos.

A evolução histórica do conhecimento humano, a fenomenal quantidade de conteúdos produzidos pela civilização coloca em cheque um processo de ensino que se limite a transmitir conhecimentos. É consenso hoje que a simples memorização de conteúdos é inócua e que o ensino deve transpor esse nível. A conquista pelo homem contemporâneo de um instrumento de armazenamento de informações universal, disponível em uma rede que funciona 24 horas sobre 24 horas, sem fronteiras geográficas, linguísticas ou barreiras políticas, aliada a potentes ferramentas de busca, parece ser um fato que argumenta de forma contundente na consideração dessa inocuidade da memorização mecânica.

O que, no entanto, torna a busca do conhecimento ainda precária, perra, lenta, pesada, difícil para a grande maioria dos estudantes universitários?

Essa pergunta talvez nos leve a vislumbrar quais procedimentos, habilidades, atitudes ou posturas precisariam ser desenvolvidos pelos professores nos (com) seus alunos em sala de aula para atingir aquilo a que se propõem as instituições de ensino universitário - formar profissionais qualificados na sua área, capazes de atualizar-se e de usar a sua competência técnica com ética e responsabilidade social.
Essa ampla expectativa da sociedade em relação ao papel da universidade é uma lente que nos permite olhar a avaliação - esse "micro" procedimento acadêmico - com maior "definição", para usar a linguagem dos megapixels.
Tomemos essa proposição em suas partes :

1. formar profissionais qualificados exige informação sobre os conhecimentos e práticas acumulados na área, conhecer como outros resolveram seus problemas , quais as práticas consagradas e as obsoletas e mesmo alguns saberes "de cor".

2. adquirir competência técnica exige mais que informação, exige também habilidades como ser capaz de dicernir entre variados procedimentos, julgar pressupostos ou opiniões de forma a adequá-los a situacões particulares, buscar dentro de um arsenal de dados aqueles que levariam à solução de um problema. Isso se aproxima da noção que se tem de competência , que não é um saber latente, mas ativo, que se mobiliza diante de um problema.(Perrenoud)

3. ética e responsabilidade social não é propriamente um conhecimento, é um saber, uma atitude que se desenvolve no convívio com outros , em que se conhecem diversos pontos de vista , os limites de uma atitude, se conhece o mundo sob ponto de vista do outro - o heterocentrismo de que falava Piaget. Jürgen Habermas, em sua teoria da razão comunicativa afirma que o conhecimento precisa ser validado socialmente, no consenso entre iguais. Esse fórum está dentro da sala de aula, é funcão da academia estimular o debate que valida socialmente procedimentos e práticas profissionais.

4. atualizar-se, esse quarto elemento primordial e , diríamos, " pós-processo" não é possível sem autonomia e isso é algo que se desenvolve (ou não) "no processo", nos bancos acadêmicos, pelo modo como o professor se posiciona em classe e conduz o trabalho, que pode ser de exclusiva responsabilidade dele ou partilhado com os alunos, que poderiam, assim, aprender a gerir seu próprio processo de aprendizagem desde o momento em que são ainda tutorados, durante o curso, pelo professor.

De posse desses elementos, é possível fazermos uma correspondência com os três tipos de conhecimento que compõem um currículo na visão de Cesar Coll - que eliciam três tipos de objetivo que devem ser perseguidos pelos docentes:
1. Conhecimentos conceituais - aqueles que tratam de conceitos, proposições, dados, fatos.

2. Conhecimentos procedimentais - aqueles que tratam de procedimentos como pesquisar, acessar um site, selecionar uma informação relevante dentre muitas outras, encontrar uma situação análoga, ler para informar-se . Todos esses são conhecimentos que, de modo geral, não são ensinados, porque se pressupõe que o estudante os domina - o que na grande maioria dos casos não é verdade. Os alunos, embora saibam ler para entreter-se, divertir-se, nem sempre sabem ler para conhecer, para extrair uma informação.

3. Conhecimentos atitudinais - que não são informações ou técnicas, mas atitudes a serem incorporadas pelo aprendiz, que passam a fazer parte da sua postura ética. Sim, o nosso aluno precisa aprender na faculdade o código de ética da sua profissão e isso não se dá na disciplina específica "Ética Profissional" - com mais conteúdo a ser vertido na prova - senão no debate diário que deve ser propiciado por cada professor do curso, entre pessoas adultas e em formação, capazes de demonstrar pontos de vista, trazendo fatos e argumentos que enriqueçam a discussão de questões polêmicas, em um ambiente em que seja posível e desejável que cada um se manifeste.

Ora, se o ensino engloba essas três facetas, assim também deve ser a avaliação . Um momento de reflexão e troca, coletivo ou individual (o professor e cada aluno, por exemplo, em uma atividade de leitura e escrita, o que se convencionou chamar de prova, mas em que se diga e contraponha, aprecie e rebata), um momento em que é possível pensar, refletir e expressar conclusões sobre o que foi dito,discutido, lido ou falado ao longo de um período determinado. Nesse momento, esses objetivos ou aspectos se entrelaçam, não mais didaticamente apostos, mas em um todo amalgamando capaz de gestar, passo a passo, bimestre a bimestre, o que se chamaria de um profissional competente, qualificado e ético.


E por que é dicifil?
Um dos nossos lamentáveis consensos é que os alunos têm enorme dificuldade de atingir graus elevados de qualificação acadêmica e as razões disso são inúmeras - falta de competências específicas de leitura, escrita e cálculos, falta de habilidade para organizar idéias, concluir a partir de informações, emitir pareceres sobre situações conflitantes, identificar indícios e sintomas relevantes para fundamentar uma opinião e decisão(Schön). Talvez em posição secundária se colocasse a FALTA de informação.

Assim, nos parece que, muitas vezes, o professor direciona a sua metodologia de ensino e o seu tempo de sala de aula não para aquilo que realmente falta no aluno, para aquilo que emperra, que torna lento, pesado e difícil o processo de aprender, mas para aquilo que ele mais facilmente obtém - a informação pura e simples. O professor que centra seus processos avaliativos apenas na informação, na memorização de conceitos, fatos e princípios, além de necessitar fazer grandes recortes no imenso cabedal de conhecimentos disponível na sua área, de forma a que o aluno seja capaz de "aprender" em um bimestre, ele deixa em segundo plano a avaliação de habilidades, procedimentos e de principios que dificultam tanto o processo de aprendizagem, como tornam remota a possibilidade da formação de um profissional de qualidade - capaz de encontrar soluções para resolver problemas e fazê-lo com base em princípios éticos, que respeitem o homem comum.

Avaliação, afinal, é um momento de aferição ou um momento de reflexão - que engloba aspectos amplos da aprendizagem, como conceitos, procedimentos e princípios - sobre as trocas profícuas que se realizaram em sala de aula em determinado período da vida acadêmica de um profissional ?


Referências COLL, Cesar - (1991): Psicología y currículo. Paidós, Barcelona.
HABERMAS, Jürgen - (1987): La Acción Comunicativa. Tomo I.Editorial Taurus. Madrid.
PERRENOUD, Philippe - (2000), Dez Novas Competências para Ensinar.Porto Alegre, Artmed.
PIAGET, Jean- (1967):Seis Estudos em Psicologia. Rio de Janeiro: Forense,
SCHÖN, Donald -(1988): Educating the Reflective Practitioner: Toward A New.Design for Teaching and Learning in the Professions. San Francisco, Jossey-Bass .


 

Autor deste artigo: Maria Ceres Rodrigues Murad - participante desde Qui, 23 de Março de 2006.

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