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OAB, MEC e a Reforma do Ensino Superior PDF Imprimir E-mail
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Escrito por Edson De Oliveira Nunes   
Qua, 26 de Maio de 2004 21:00

O momento em que se discute a reforma da educação superior, errônea e insistentemente chamada de reforma universitária, é propício para analisar, senão corrigir de vez, a indesejável, predatória e animosa relação entre autoridades educacionais e ordens profissionais.

No Brasil, profissão é assunto universitário. E universidade é assunto profissional. Tem tudo para dar errado. O Plano Nacional de Educação, que é uma Lei, manda que o ensino superior se expanda exponencialmente, abrigando 30% dos jovens entre 18 e 24 anos, em 2010. Isto equivaleria a dobrar o contingente atual. Mas em verdade, é muito mais que isso, dado que grande parte da população universitária brasileira está fora da idade certa para o ciclo educacional. De fato, o número de estudantes de terceiro grau, mantidas as proporções etárias atuais, deveria ser de 12 milhões de estudantes daqui a seis anos. Praticamente quadruplicar o número atual de estudantes em seis anos.

Ora, se tivéssemos aquele número de estudantes superiores em 2010, sanearíamos uma das, entre muitas, graves vergonhas estatísticas brasileiras em perspectiva comparada com outros países. Mas as ordens profissionais dizem ao MEC: "não abram mais cursos porque estamos saturados de profissionais". E dizem isso por uma consciência de mercado, por um lado, e por uma preocupação relativa à qualidade do ensino e o eventual aviltamento da profissão e remuneração, por outro lado.

Não é possível quadruplicar um sistema em 6 ou 10 anos, sem perda de qualidade. Nenhum sistema que dependa de recursos humanos treinados para sua expansão é capaz de se expandir a esta taxa de crescimento, sem que haja perda de qualidade, pelo simples fato de haver menos gente ensinando e mais gente sendo incorporada. Há uma impossibilidade numérica: denominador muito grande, comparado com numerador pequeno, e os dois crescendo a taxas distintas.

Portanto, persiste o problema de zelar pela qualidade e garantir o não-aviltamento profissional. Diante destas questões, pergunta-se, quem está com a razão? A lei chamada de Plano Nacional de Educação? As corporações? O mundo empresarial que clama por mais recursos humanos de qualidade?

Estranhamente, todos tem razão. E já que precisamos fazer crescer robustamente o número de estudantes do terceiro grau, resta tomar medidas que permitam o crescimento e, simultaneamente, zele pela qualificação profissional.

No Brasil chama-se de profissão a coisas que são meras ocupações gerenciais no setor terciário. Estas ocupações todas podem perfeitamente ser desempenhadas por pessoas "não-profissionais", mas muito mais qualificadas para o trabalho, pessoas que falem e leiam uma segunda língua, que sejam versadas em raciocínio lógico-quantitativo, versadas e hábeis em computação aplicada, que escrevam muito bem e sejam capazes de fazer apresentações orais competentes e claras, que tenham bom conhecimento da herança cultural e humanística, que entendam a diferença entre um genoma e um cromossomo. Ainda agora no mês de abril a Universidade de Harvard publicou alentado relatório sobre a revisão do currículo da universidade, no qual afirma que, numa era de crescente especialização, profissionalização e fragmentação na educação, considera essencial mesmo a educação mais geral em humanidades e ciências, de modo a permitir aos estudantes uma vida inteira de aprendizagem e adaptação. Profissão é para depois.

A profissão não deve mais se confundir com a educação universitária, coisa que no Brasil se transformou em sinônima e cuja principal virtude é formar analfabetos funcionais para a adaptação ao ambiente cambiante, progressivamente mais técnico e mundializado. Aqui no país, profissão é coisa universitária, bem como assunto de governo. Não parece razoável que o governo tenha que determinar os contornos de diretrizes curriculares nacionais, muito menos determinar a duração de cursos superiores. Isto não deveria ser assunto governamental, nem das corporações, mas sim das casas de ensino. Mas não somente é assunto governamental, como constitui permanente área de atrito entre autoridades educacionais e corporativas.

Para cada profissão de nível superior reconhecida por lei existe a pretensão de controlar o que a universidade faz naquele departamento. Seria o caso de destravar esta engrenagem que atravanca a vida acadêmica brasileira e se interpõe à expansão do ensino, transformando as profissões-as de verdade, já que a maioria poderia perfeitamente inexistir sem nenhum prejuízo para a sociedade-em assunto pós-graduado. Médicos e advogados, para falar nas duas mais poderosas profissões de verdade, se beneficiariam de uma prévia formação universitária, mais humanística ou mais científica, ingressando posteriormente na escola profissional. O controle desta escola profissional poderia perfeitamente ser compartilhado com as corporações, que participariam da definição de currículos, regras de acreditação, regras para obtenção da licença profissional, sem nenhum conflito com as casas de ensino, pois educação universitária é uma coisa, profissão é outra.

Tomemos por exemplo o ensino jurídico. Seria perfeitamente plausível, senão desejável, que tivéssemos um bacharelado em Ciências Jurídicas, Humanas e Sociais, aberto a muitos, a todos que desejassem uma educação de terceiro grau, seguido de um curso pós-graduado para a formação de advogados, brutalmente seletivo, aberto a pouquíssimos. O bacharel poderia vir a ser advogado, se assim desejasse. Mas para isso, teria que ingressar, através da moenda restrita e competitiva, no curso pós-graduado, de formação de advogados, ou como prefere o jargão imperante, de operadores do Direito. Possivelmente conseguiríamos fazer isso num ciclo de seis ou sete anos de estudos, ofertando à sociedade profissionais de qualidade incomparável. Aqueles que ingressassem na universidade aos 18 anos poderiam ser advogados formados e registrados aos 24/25 anos, tendo passado por dois ciclos de ensino, um universitário, outro profissional. Meninos e meninas seriam médicos um pouco mais tarde, já que seria de se esperar que o ciclo de formação médica fosse mais longo. . O mesmo princípio poderia se aplicar aos economistas, administradores em geral, cuja formação profissional poderia perfeitamente ser cumprida em dois anos, ou ano e meio intensivo de pós-graduação. A lógica, duração, conteúdo e licenciamento desses cursos profissionais poderiam ser compartilhadas entre governo, casas de ensino e corporações, dissociando o ciclo profissional do ciclo universitário, liberando o ensino superior das amarras corporativas, preservando a qualidade e a supervisão da educação profissional, reconciliando aquilo que hoje é antagônico.

As corporações profissionais precisariam ter o gosto, senão a coragem, para o desafio de ingressar numa nova era, de elevação dos patamares para a obtenção da licença para a prática profissional, considerar a indispensabilidade de exames de ordem duríssimos, superlativos. Ainda hoje a OAB, por exemplo, resmunga, com razão, sobre a qualidade do ensino jurídico, com base em seus exames de ordem, mas ainda não os faz de rarefeita qualidade, como deveria fazer. Muito menos os faz em termos nacionais, mas sim regionais, apesar de conferir licença nacional. Se a licença é nacional, como pode o exame não o ser? E os médicos, que exame nenhum fazem, muito menos os dentistas? Diploma à mão, praticam seu mister, contra nós, ou a nosso favor, Deus nos tenha!

Poder-se-ia argumentar, criticamente, que esta sugestão vai elitizar as profissões e o ensino profissional. Perfeitamente. Vai mesmo. E para o bem de todos, estou seguro. Com uma vantagem adicional, daríamos uma acertada no linguajar corriqueiro, que hoje chama de "doutores" a todos os bacharéis em direito e medicina.

 

Autor deste artigo: Edson De Oliveira Nunes - participante desde Ter, 20 de Abril de 2004.

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