RESUMO Este artigo, de caráter eminentemente teórico, apresenta um corte específico da teoria da administração com aplicação na gestão das instituições de ensino superior (IES) e tem por objetivo conduzir a uma reflexão a cerca do comportamento de liderança e seu respectivo mecanismo de tomada de decisão, bem como o grau de participação do nível gerencial, ou seja: da coordenação de cursos no processo decisório em níveis estratégicos. Palavras-chave: Estilo de liderança, tomada de decisão, instituição de ensino superior (IES).
INTRODUÇÃO O comportamento de liderança dos dirigentes de toda a organização e nisso se incluem as instituições de ensino superior (IES) sempre será um elemento muito importante que definirá o formato e o grau de participação do nível gerencial, ou seja: da coordenação de cursos na tomada de decisão em níveis estratégicos.
O que se percebe de uma forma geral nas instituições de ensino superior é que, quanto mais operacional for seu corpo gerencial (coordenação de cursos), menor será sua capacidade de contribuir com a tomada de decisões em nível estratégico da organização. Este artigo está dividido em quatro partes. Na primeira delas encontra-se uma breve introdução sobre o tema, na segunda é discutido o termo liderança no contexto das instituições de ensino superior, na terceira parte versa-se sobre o processo de tomada de decisão, na quarta é apresentado um panorama geral de como se divide uma instituição de ensino superior levando em consideração os níveis de uma organização e por fim, estão dispostas as considerações finais sobre o tema. 2. Liderança Bass (1990, p. 19) define liderança como sendo uma interação entre dois ou mais membros de um grupo que freqüentemente envolve estruturação ou reestruturação de uma situação e as percepções e expectativas dos membros. Um ponto que chama a atenção nesta definição é a presença do termo interação. A interação pode ser de dois tipos: focalizada e não focalizada (Giddens, 2003, p. 83), que ocorre em contextos sociais localizados no tempo e espaço e pressupõem o encontro de duas ou mais pessoas que se monitoram mútua e reflexivamente. A interação não focalizada compreende em gestos e sinais limitados pelo posicionamento da face (co-presença). Na interação focalizada os indivíduos coordenam suas atividades pelo contínuo encontro da expressão facial e da voz. De acordo com o disposto por Cardoso (2008) o coordenador é um lider de equipes que age a fim de democratizar a participação de todos e oferecer soluções de forma compartilhada a toda a comunidade acadêmica, isto é: um articulador que precisa estar presente e fazer acontecer. Em sua obra Bass (1990) apresenta o conceito de líder como sendo o agente de mudança – pessoas cujos atos afetam outras pessoas mais do que os atos de outras pessoas os afetam. Em concordância com o conceito de interação apresentado, o autor esclarece que o líder, agente de mudança, em sua relação de liderança afeta mais os liderados, do que estes a ele.
Em se tratando de liderança, o papel do Ombudsman – ouvidor da IES – na gestão do curso é extremamente importante, pois ele trará visões dos diferentes níveis organizacionais para que as ações sejam transversalmente tratadas. Facilitará certamente a visão por processos dentro da IES e conseqüentemente a riqueza de informações disponíveis para a tomada de decisão em nível estratégico, uma vez que esse profissional terá a oportunidade de analisar os problemas por processos e ainda verificar as atividades que estão sendo realizadas em duplicidade por mais de uma área. As organizações que possuem esse tipo de profissional atuando conseguem melhorar e muito o seu desempenho uma vez que se torna possível o foco de suas ações no sistema e na melhoria contínua do mesmo. Bass (1990, p. 11) aponta o surgimento da palavra “leader” na língua inglesa como sendo por volta do ano 1300, conforme registrado pelo Dicionário de Inglês Oxford de 1930, no entanto a palavra “leadership” não possui menção nesta língua até à primeira metade do século XIX. O dicionário da língua portuguesa indica a origem da palavra líder no termo leader, seu equivalente na língua inglesa. No campo das teorias e da pesquisa podem ser identificados quatro diferentes abordagens ou grupos de teorias sobre liderança: do traço pessoal, do estilo ou comportamental, da contingência e da nova liderança ou neocarismáticas (Bryman, 2004; Robbins, 2002). Neste trabalho será dada maior ênfase à abordagem de estilo ou comportamental. A teoria de estilo ou comportamental foi uma alternativa frente a algumas impossibilidades da abordagem do traço pessoal, pressupõem que comportamentos específicos diferenciam os líderes dos liderados (Robbins, 2002, p. 305) e sua ênfase seria no processo de treinamento, pois liderança pode ser ensinada (Bryman, 2004, p. 260). Nesse âmbito muitos autores notórios no tema afirmam sem muitas reservas que a liderança pode ser aprendida (Gardner, 1990; Bennis e Nanus, 1988). Trewatha (1979) consolida os pontos comuns dentre vários modelos que enfatizam o estilo de liderança na visão de alguns dos principais estudiosos sobre liderança considerando aspectos técnicos e humanos, conforme pode ser verificado no quadro 1. QUADRO 1: PONTOS COMUNS DOS VÁRIOS MODELOS DE LIDERANÇA Teoristas
| Dimensões de liderança
| Comportamento Técnico | Comportamento Humano
| 1. R. F. Bales | Orientação para trabalho | Orientação para relações humanas | 2. Rensis Likert | Autoritária | Democrática | 3. Tannenbaum e Schmidt | Estrutura iniciativa | Consideração | 4. Estudos de Ohio | Interesse por produção | Interesse por pessoas | 5. Blake e Mouton | Tarefa | Relacionamentos | 6. W. J. Reddin, 3 Dimensões | Centrada no cargo | Centrada no empregado |
FONTE: TREWATHA (1979) Likert (1975) realiza um estudo com base em dados quantitativos que utiliza quatro tipologias: autoritário rígido, autoritário benevolente, deliberativo e participativo, cruzadas com informações referentes à motivação, comunicação, interação, tomada de decisões, fixação de metas, controle e desempenho. A qualidade da liderança é apontada como uma das variáveis importantes na contabilização dos ativos humanos. Tannenbaum e Schmidt (1986) apresentam em seu modelo uma escala de sete pontos, que varia num contínuo entre os conceitos dicotômicos de autoridade (autoritarismo) e liberdade (democracia). FIGURA 1: AUTORIDADE NO LIDER X LIBERDADE DOS SUBORDINADOS
FONTE: TANNENBAUM E SCHMIDT (1986)
O modelo de “Grid Gerencial” desenvolvido por Blake e Mouton (1975) relaciona a alta e baixa orientação tanto para pessoas, quanto para a produção. A orientação para a produção pode ser identificada na qualidade das decisões inerentes a tudo o que é resultado dos esforços das pessoas e a orientação para as pessoas, expressa o grau de compromisso assumido, respeito baseado em confiança ao invés de obediência, relações sociais ou amizades com os colegas de trabalho. 3. Tomada de Decisão A tomada de decisão é o processo pelo qual as organizações são estruturadas e reestruturadas (HALL, 2004). Pode ser definida também como a escolha de um rumo de ação entre várias alternativas possíveis para se chegar a um resultado desejado (BUTLER, 1991). A alta direção de uma instituição de ensino superior – direção e seus conselheiros – responsável pelo processo de tomada de decisão em nível estratégico e definir os rumos da organização, optar por agregar valor ao seu processo decisório, constituindo um conselho acadêmico forte e engajado nas estratégicas da IES ou decidir de maneira singular. A origem do termo “tomada de decisão” na administração se deu a partir de debates entre economistas e teóricos organizacionais. Os economistas tradicionalmente construíram seus modelos com base no homo economicus e no modelo tomada de decisão do ator racional. Preocupados com os aspectos sociais da tomada de decisão, March e Simon (1966) questionaram tal abordagem por meio de estudos empíricos, comprovando que a tomada de decisão racional só ocorre sobre circunstâncias muito restritas e severas (Hatch, 1997). Com base na evolução histórica de diferentes abordagens sobre a análise da tomada de decisão, Schwenk (1988) observa a predominância de três modelos de análise, que são: (i) o modelo racional; (ii) o modelo organizacional e (iii) o modelo político. Numa IES pode existir os três modelos de análise supra citados, entretanto aquele que for praticado com maior veemência é que ditará o grau de participação do nível gerencial (coordenador de curso) no processo de tomada de decisão. A característica essencial do modelo racional baseia-se fundamentalmente na visão da decisão como produto da escolha consciente e racional, isto é, pela busca de resultados ótimos e maximização dos resultados no processo decisório no nível individual (SCHWENK, 1988; MACIEL, HOCAYEN-DA-SILVA e CASTRO, 2006). Desta forma, este modelo considera que o tomador de decisão conhece todas as soluções possíveis e suas conseqüências e que ele é capaz de classificar as alternativas em função da maximização dos resultados, conforme aponta Hall (2004). O processo de tomada de decisão dessa abordagem pode ser descrito por meio dos seguintes processos: (i) definição do problema, (ii) geração e avaliação das alternativas, (iii) escolha da “melhor” alternativa, (iv) implementação da alternativa escolhida, (v) monitoramento e avaliação dos resultados obtidos e, (vi) feedback do processo (HATCH, 1997). Este modelo decisório é comumente percebido nas IES onde o conselho acadêmico se reúne apenas para cumprimento de mera formalidade e, onde a visão da direção geral terá sempre um peso que anula a opinião dos demais membros desse grupo. O modelo organizacional de tomada de decisão conserva muitos insights do modelo racional, porém a principal diferença entre esses dois assenta-se no objetivo da decisão. Enquanto o primeiro busca a decisão ótima, o segundo modelo se satisfaz com a decisão mais adequada possível (MACIEL, HOCAYEN-DA-SILVA e CASTRO, 2006). O ponto principal sobre este modelo é a ênfase na necessidade de se fazer decisões com informações incompletas, sob a pressão do tempo, podendo haver conflito entre as preferências dos decisores em relação aos objetivos organizacionais e aceitar que uma solução ótima não pode ser sempre conseguida dentro destas limitações. A racionalidade, conseqüentemente, é limitada (SIMON, 1965) e se vincula à inabilidade do sistema em proporcionar o máximo de informações e à inabilidade do decisor para processar as informações disponíveis. Nesse modelo, a participação dos membros gestores se dá com maior ênfase e isso ocorre pois a alta direção da IES tem em mente que um maior número de pessoas pensando juntas a cerca de um mesmo problema, pode fazer com que a racionalidade limitada seja diminuída e, com isso, o grau de certeza de que se tomou a decisão correta, maior. Por fim, o modelo político afirma que as decisões são vistas como resultado de um jogo político baseado na negociação entre os indivíduos (SCHWENK, 1988). A racionalidade do “jogo” é que os jogadores mais fortes, justamente aqueles que definem as regras (racionalidade), são os que marcam os pontos. Não existe, porém, uma única racionalidade invariável. O exercício do poder é um componente importante da tomada de decisões, bem como o processo de comunicação, que pode ser problemático. Quanto maiores as decisões tomadas, maiores também são os níveis de incerteza (HALL, 2004). Nesse cenário, o modelo político faz com que o processo decisório extrapole a visão da IES que passa a ser mais vulnerável às influências externas a que está sujeita, neste modelo, torna-se difícil levar em consideração as informações trazidas inicialmente pelos gestores da IES, pois algo maior acaba vigorando o processo decisório e os rumos da organização. 4. Instituições de Ensino Superior De acordo com Cardoso (2008), uma instituição de ensino superior trata-se de uma organização constituída por dois blocos integrados que podem ser classificados como atividades meio, ou seja: tudo o que sustenta ou viabiliza a produção acadêmica; e atividades fim, que se refere à própria atividade acadêmica (ensino, pesquisa e extensão). Como toda e qualquer organização, a IES também possui os níveis estratégico, tático e operacional. Abaixo seguem as principais atribuições de cada um desses níveis e os envolvidos em cada um deles. QUADRO 2 – Níveis organizacionais de uma IES e suas respectivas atribuições FONTE: CARDOSO, 2008
5- CONSIDERAÇÕES FINAIS Este trabalho permitiu conhecer o quão importante é o comportamento em termos de liderança da alta direção de uma instituição de ensino, pois isso influencia diretamente na forma como se da o processo decisório em questões acadêmicas, estratégicas e até mesmo institucionais, seja no nível estratégico, tático ou operacional. Quanto mais autocrático for o estilo de tomada de decisão, menor será o grau de liberdade dos níveis gerenciais – neste caso, o coordenador de curso – e operacionais da instituição. Neste contexto, quanto mais estimulada for a participação dos membros do conselho acadêmico da instituição, maior será o envolvimento desses no processo decisório e com isso, maior será o envolvimento deste nível na implantação das estratégicas definidas pela cúpula. É evidente que, em termos de comportamento de liderança, cada líder apresenta um estilo próprio de tomada de decisão que é influenciado diretamente pela riqueza de informações que se tem à disposição no momento da tomada de decisão. A decisão de ter uma coordenação de cursos mais focada no operacional ou no estratégico é da alta direção da organização e isso se reflete na quantidade de recursos humanos, materiais e financeiros dedicados a cada um dos níveis organizacionais. Desta forma, quanto menos pessoal envolvido no nível operacional da IES, maior será a carga de responsabilidade por atividades operacionais por parte da coordenação de curso e menor será o tempo de dedicação a questões gerenciais e contribuições às decisões estratégicas da IES. Recomenda-se para pesquisas futuras, a realização de estudos práticos para evidenciar a interferência da variável liderança no processo decisório de uma instituição de ensino superior e,assim, justificar de forma prática a relevância dos estudos a cerca do tema neste artigo explorado. 6- REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS BASS, B. M. Bass & Stogdill´s handbook of leadership: theory, research, and managerial applications. 3. ed. New York: The Free Press, 1990, p.3-36. BENNIS, W.; NANUS, B. Líderes – estratégia para assumir a verdadeira liderança. Tradução Auriphebo Berrance Simões. São Paulo: Harbra, 1988. BLAKE, R. R.; MOUTON, J. S. O grid gerencial. Tradução Equipe Técnica da CONCISA. 3. ed. São Paulo: Livraria Editora Pioneira, 1978. BRYMAN, A. Liderança nas organizações. In: Handbook de Estudos Organizacionais. v.3., p.257-281, São Paulo: Atlas, 2004. BUTLER, R. Designing organizations: a decision-making perspective. London: Routledge, 1991. CARDOSO, W. M. Programa de capacitação para coordenadores de cursos de instituições de ensino superior. Carta Consulta. Belo Horizonte, MG: 3ª Ed. 2008. GARDNER, J. W. Liderança – sucesso e influência a caminho da modernidade. Tradução de Eduardo Francisco Alves. Rio de Janeiro: Editora Record, 1990. GIDDENS, A. A constituição da sociedade. Tradução de Álvaro Cabral. 2. ed. São Paulo: Martins Fontes, 2003. HALL, R. H. Organizations: structures, processes, and outcomes. 8th ed. New Jersey: Prentice Hall, 2004. HATCH, M. J. Organization theory: modern, symbolic, and postmodern perspectives. New York: Oxford University Press, 1997. LIKERT, R. A organização humana. Tradução Márcio Cotrim. São Paulo: Atlas, 1975. MACIEL, C. O.; HOCAYEN-DA-SILVA, A. J.; CASTRO, M. A Utilidade de Diferentes Modelos de Tomada de Decisão Na Explicação do Comportamento Estratégico das Organizações. In: anais do IX SEMINÁRIOS EM ADMINISTRAÇÃO, FEA – USP. Disponível em: <http://www.ead.fea.usp.br/Semead/9semead/resultado_semead/trabalhosPDF/213.pd f>. Acesso em: 01 nov. 2006. MARCH, H. G. e SIMON, H. Teoria das organizações. Rio de Janeiro: FGV, 1966. ROBBINS, S. P. Comportamento organizacional. Tradução de Reynaldo Marcondes. 9. ed. São Paulo: Prentice Hall, 2002. SCHWENK, C. R. The essence of strategic decision making. Lexington, Mass: Lexington Books, 1988. SIMON, H. Comportamento administrativo. Rio de Janeiro: FGV, 1965. TANNENBAUM, R.; SCHMIDT, W. H. Como escolher um padrão de liderança. In: Coleção Harvard de Administração. v. 5. São Paulo: Abril,1986. TREWATHA, Robert L. et al. Administração: funções e comportamento. Saraiva. São Paulo, SP: 1ª ed. 1979.
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