Captação de Recursos e Sustentabilidade das IES Privadas Filantrópicas Imprimir
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Escrito por Carlos Eduardo de Araújo Nogueira   
Qua, 08 de Abril de 2009 00:00

Ultimamente, a imprensa brasileira vem reportando cada vez mais matérias referentes às instituições de ensino que estão lançando mão de estruturas e estratégias de captação de recursos para a sustentabilidade institucional a longo prazo. A mais recente foi publicada na Folha de São Paulo, dando conta de que a USP vem captando recursos, por meio de doações de seus ex-alunos, para reformar um prédio construído em 1939.

 

Na mesma edição, outra matéria cita como exemplo a Universidade Stanford, que em 2008 foi a recordista entre as universidades americanas, tendo captado US$ 911 milhões. Ano passado, logo depois de estourar a crise dos subprime, foi a vez da Universidade Harvard aparecer nos jornais e informativos do ensino superior. A notícia não poderia ser das melhores. A matéria dizia que a universidade estava estudando uma redução na oferta de suas bolsas, devido à diminuição no volume captado para sustentar seu fundo patrimonial, orçado em mais de US$ 36 bilhões.

 

Captação de recursos não é assunto novo. As ONGs e instituições sem fins lucrativos, que atuam na sociedade em demandas diversas, já utilizam técnicas e estratégias reconhecidamente eficazes para sua sustentabilidade.

 

O assunto passou a atrair mais a atenção das IES após o I Encontro Brasileiro de Captação de Recursos, realizado em 2007 em São Paulo pelas Faculdades Integradas Rio Branco, em parceria com a Association of Fundraising Professionals – AFP e apoio da Associação Brasileira de Captadores de Recursos - ABCR. Em dois dias foram apresentados os principais aspectos ligados à captação de recursos em instituições de ensino superior, tendo Harvard como um dos exemplos. Instituições nacionais também apresentaram seus cases.

 

O assunto também entrou na pauta do SEMESP que, no intuito de ajudar na melhoria da gestão das IES privadas de São Paulo, desenvolveu parceria com uma empresa de intercambio para levar mantenedores e gestores de universidades brasileiras aos Estados Unidos. A idéia é conhecer as melhores práticas das instituições de ensino superior americanas, em termos de sistemas de gestão, tecnologias, questões pedagógicas e políticas educacionais, além de saber como as instituições de lá fazem para se viabilizar com seus alumni. No pacote da viagem também está incluído conhecer a estrutura profissional de captação de recursos (“fundraising”) de um ‘College’.

 

Harvard não está no roteiro. Se estivesse, os visitantes iriam se deparar com um departamento de desenvolvimento institucional – DDI composto de quase quinhentos profissionais e voluntários, trabalhando para garantir a continuação de suas atividades, projetos, programas de bolsas de estudos, de iniciação científica, de pesquisas, atualização de laboratórios e bibliotecas, manutenção e ampliação de instalações. Mesmo com tanto dinheiro guardado no fundo patrimonial, Harvard não deixa de cobrar, e bem, por seus serviços educacionais. Cursar Medicina, por exemplo, pode custar mais de US$ 300 mil, sem contar as despesas acessórias.

 

A captação profissional de recursos voltada à sustentabilidade das instituições privadas filantrópicas de ensino superior está começando a engatinhar no Brasil, como aconteceu com o México há 15 anos. Enquanto isso, continuamos lutando para ter acesso aos financiamentos públicos, como o movimento em direção ao BNDES, para emplacar o cadastro de maus pagadores e outras medidas imprescindíveis.

 

No último Fórum das Entidades Representativas do Ensino Superior Particular, o Prof. Hermes Figueiredo, presidente do SEMESP, disse com propriedade que "um setor que depende exclusivamente do pagamento de mensalidades dos alunos não pode sobreviver com uma inadimplência tão alta". Sem dúvida que este é um problema bastante relevante para as IES privadas e filantrópicas. Entretanto, toda crise traz consigo uma oportunidade latente. Como vamos driblar essa dificuldade para continuar cumprindo nossa missão? Um setor que depende exclusivamente do pagamento de mensalidades precisa encontrar outras formas de viabilizar-se. Sem dúvida que pressionar o Governo a expandir as formas de financiamento estudantil é uma dessas medidas. O movimento da OAB-SP e de representantes do ensino superior daquele estado, no sentido de propor ao ministro Fernando Haddad desconto de IR para pessoas físicas e jurídicas que fizerem doações em dinheiro para a reforma de salas de aula e para a concessão de bolsas de estudos, é outra alternativa. Da mesma forma que constituir áreas de marketing, tornando as IES ativas no processo de criar demandas e fidelizar alunos é mais do que oportuno neste momento.

 

A captação de recursos da sociedade e da comunidade acadêmica é uma outra alternativa viável. O pessoal de Harvard e de Stanford sabe, há muito tempo, que ex-alunos, grandes nomes e fortunas (podem e) ajudam muito, sem contar o que conseguem captar de outras fontes. USP, Mackenzie, Faculdades Rio Branco, UFRGS, EAESP-FGV, UFSC, só para citar algumas, já lançam mão dessa alternativa há alguns anos, e com sucesso. Mas é bom deixar claro que a captação de recursos não é solução de curto prazo. Construir a cultura da doação para viabilizar uma Educação inclusiva e de qualidade é tarefa institucional dos Sinepes, da Anaceu, do Consed, da ABMES, da Abrafi, da Anup e das próprias IES no seu dia a dia.

 

Um estudo do SEMESP, de 2005, abordando a Responsabilidade Social das IES, levantou junto às 440 instituições privadas, autorizadas naquela época, o que elas vinham fazendo em termos de trabalhos sociais para a comunidade. Desse universo, 32% eram instituições filantrópicas. Os projetos implementados, em 67% dos casos, contemplavam a comunidade em geral e apenas 20% a comunidade no entorno da IES. Do total de 5,9 milhões de pessoas beneficiadas, 51% delas foram atendidas em projetos estritamente filantrópicos contra 49% em projetos curriculares. O que as IES têm feito para mostrar à sociedade que seu papel social é relevante? Trabalhar a extensão comunitária, indo além da extensão acadêmica, é uma das formas de consolidar o importante papel que as IES filantrópicas exercem na sociedade, e com isso abrir caminho para comprometer alunos, ex-alunos e colaboradores com a manutenção de suas atividades. Esse estudo só demonstra que as IES privadas entenderam o recado: é ajudando a resolver os problemas comuns, que afetam a IES e a comunidade no seu entorno, que se abre o caminho para ter a própria comunidade contribuindo para garantir a manutenção da instituição. Esse é um dos princípios da captação de recursos profissional, para garantir a sustentabilidade das IES filantrópicas a longo prazo.

 

(*) C. Eduardo A. Nogueira é mestre em Administração e Desenvolvimento Empresarial, professor universitário, gestor de IES, membro da Associação Brasileira de Captadores de Recursos – ABCR e sócio-diretor da Habilis Consultoria e Assessoria Ltda. ( Este endereço de e-mail está protegido contra SpamBots. Você precisa ter o JavaScript habilitado para vê-lo. )

 

Autor deste artigo: Carlos Eduardo de Araújo Nogueira - participante desde Seg, 09 de Março de 2009.

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